Segundo o que se sabe, Alan Freed apenas buscou um nome que ele julgava associar a música com a dança frenética que os adolescentes exercitavam. “To rock” é balançar e “to roll” é rolar. Basicamente o nome significa “Balançar e Rebolar”. E as duas palavras (rock e roll) já vinham sendo usadas em canções e em seus títulos, portanto o nome lhe parecia muito natural e de fácil assimilação, o que de fato era.
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Alan Freed, também conhecido como "Moondog", foi um disk-jockey norte-americano, reconhecido como o criador do termo "rock 'n' roll"
O que Alan Freed não sabia é que o termo era, dentro da comunidade negra, um sinônimo para sexo. Exprimem dois movimentos naturais exercidos durante uma relação sexual, o balanço cadenciado de cima para baixo e o rebolar do casal em horizontal. E esta conotação passou a ficar mais popular nos anos vinte, segundo consta, com o surgimento de uma canção, lançada pelo Black Swan Records no outono de 1922: “My Daddy Rocks Me (With One Steady Roll)”, gravada pela cantora Trixie Smith.
Esta canção não só populariza a conotação sexual destas duas palavras como também as une pela primeira vez na indústria fonográfica. Traduzindo literalmente seria “Meu Papai Me Balança (Com Um Firme Rebolado)”. Diga-se de passagem que o termo escolhido, ‘Meu Papai’ é gíria para dizer ‘Meu Homem’ ou ‘Meu Macho.’ Composição de J. Berni Barbour, este pequeno sucesso de Trixie Smith abriu precedente para uma enxurrada de outras canções usando o termo rock de formas igualmente sugestivas. Dois exemplos seriam as canções “Rock That Thing” de Lil Johnson e “Rock Me Mama” de Ikey Robinson, que surgiram naquele mesmo ano.
Com a chegada dos anos trinta, o termo rock já não se limita a sugerir a relação sexual de um casal, passando a ser usado como um adjetivo para ilustrar a sensualidade existente no ritmo da música. Um dos primeiros exemplos deste uso é com “Rockin’ in Rhythm” de Duke Ellington, lançado pela Victor Records em 1931. Com o Duque, maneira que Duke Ellington era reverenciado, a palavra ‘rock’ conseguia popularidade não somente na comunidade negra mas tambem entre a população branca. Esta possivelmente seja a primeira vez que uma grande gama de pessoas da comunidade branca tenha ouvido a expressão.
Curiosamente, levou apenas três anos para a expressão aparecer no cinema. A película se chama “Transatlantic Merry-Go-Round”, filme da United Artists de 1934, que têm em um de seus seguimentos musicais um grupo feminino chamado The Boswell Sisters, cantando uma canção chamada “Rock And Roll.” Interpretação branca pastiche de um evento musical negro, a canção não oferece nenhuma sensualidade, nem mesmo rítmica. Contudo, ela é um marco mesmo assim, denotando a assimilação do termo, se não na música, mas ao menos dentro da cultura branca americana. Até a chegada da década de quarenta, a expressão rock and roll já seria bem absorvida na cena musical negra e tudo relacionado a ela. Desta maneira, tornava-se possível encontrar a expressão sendo usada em artigos ou reviews sobre determinada música ou artista.
Em fevereiro de 1948 uma música com o termo ‘rock’ finalmente conseguiria chegar a No.1 nas paradas do que eventualmente passaria a ser chamado de rhythm and blues ou simplesmente R&B. Digo eventualmente passaria a ser chamado porque com a segregação ainda como lei, os Estados Unidos mantinham praticamente duas sociedades e cidadanias distintas, dividas pela cor da pele. Até então, discos gravados por artistas negros para a comunidade negra, eram chamados de “race records”, ou seja, discos da raça (negra). Mas as coisas iriam mudar de uma forma extremamente rápida, muito graças ao interesse do branco em ouvir e copiar esta música.
E um dos pivôs desta mudança seria “Good Rockin’ Tonight”, uma regravação de Wyona Harris de uma canção gravada originalmente por Roy Brown no ano anterior sem muito sucesso. Chegaria a número 1 nas paradas negras e seria novamente um sucesso quando regravado por Elvis Presley uma década depois. A canção fez tanto sucesso que todo mundo passou a usar o termo, como se fosse meio caminho para um sucesso de vendas. Iniciou-se uma sucessão de canções só no ano de 1948 com títulos como “Rockin’ Boogie”, “We’re Gonna Rock”, “Rockin’ The House”, “Rockin’ At Midnight” e por aí vai.
Em meados de 1949, Wild Bill Moore lança “Rock And Roll”, que nada tem a ver com aquela canção lançada pelas Boswell Sisters, e foi considerada por um crítico como sendo a gravação “mais alta” já feita até então, uma demonstração da dificuldade que a indústria estava tendo para definir este ritmo que rapidamente se popularizava. As vendas de discos em geral começam a aumentar, o que denota o início do que os americanos chamam de ‘cross-over’, ou seja, música de um mercado, no caso o negro, vendendo significativamente tambem em outro mercado, no caso o branco.
Acontece que nos Estados Unidos, depois da Segunda Guerra Mundial, iniciou-se no país um apogeu industrial. Depois da dura década que seguiu a queda da bolsa de valores, passou a ficar extremamente fácil encontrar emprego, comprar casa, carro e um sem número de eletrodomésticos recém inventados ou disponíveis agora pela primeira vez com preços compatíveis com a realidade da família de classe média. Os anos quarenta foram, segundo muitos, um ano sedado, onde a singularidade era mau vista, e o bom era a produção em massa. Assim nasciam ruas, as vezes bairros inteiros, onde cada casa era exatamente igual à outra, todas construídas juntas e vendidas com pagamentos facilitados a perder de vista em subúrbios recém urbanizados.
À margem desta paixão pela padronização cultural, artística e intelectual, estavam os poetas Beats, que a imprensa chamaria de beatniks (nome tirado do ‘Sputnik’, então recém lançado ao espaço pela Rússia), para impingir neles uma conotação de subversivos e sugerir possivel afiliação comunista. Apesar dos Beats conseguirem levantar questionamentos legais sobre a censura de livros dentro do país, o que acabaria mesmo mudando a América de seu raciocínio homogêneo para o heterogêneo seria o interesse pela música negra por parte dos brancos, que se intensificaria durante a década de cinqüenta. Este interesse, fez com que o rótulo de ‘race records’ passasse a incomodar os ouvintes brancos, pelo seu cunho racista. Foi então que Jerry Wexler, um judeu de Nova York que escrevia para a Billboard, cria a denominação Rhythm & Blues para esta música swingada, enraizada no blues. O termo pegou e ‘race records’ caiu em desuso.
Com a chegada de 1950, o termo rock já virara mania e praticamente dois terços do que se lançava de R&B o continha em seu título. Se fizerem a pesquisa, encontrarão entre 1950 e 1952, títulos como “I’m Gonna Rock”, “How About Rockin’ With Me”, “Rock With It”, “Rock With Me”, “Rockin’ With Red”, “Rockin’ The Blues”, “Rockin’ Blues”, “Sausage Rock”, “Rock The Joint”, “Rock Me Baby”, “Rocking On Sunday Night”, “Rocket 88”, “Rock, H-Bomb Rock” e porque não, “Rock, Rock, Rock”.
A sociedade de mentalidade homogênea viu o interesse de seus filhos e filhas núbiles atraídas por estas músicas de artistas negros como algo extremamente ameaçador. Rotularam a música de pagã e ameaçaram seus filhos com as chamas do inferno se elas continuassem a ouvi-la, e quando isto não funcionou, concluíram que o diabo estava os hipnotizando com aquela música medonha. Foi em meio a este clima que Alan Freed tenta acalmar os ânimos com a criação de um novo rótulo para esta música. Se Rhythm & Blues é música negra proibida a adolescentes brancos, então vamos inventar um novo tipo de música. E assim Alan saiu com o nome Rock And Roll. Daí em diante, a história já fica bem documentada e relativamente bem conhecida.
É claro que o rock não é novo no sentindo de que saiu do nada. Ele é uma evolução natural do R&B, tendo de diferente basicamente o andamento. Little Richard certa vez definiria a diferença como rock sendo rhythm & blues em andamento acelerado. Ao chegar o ano de 1954, já teriamos Bill Haley abandonando sua carreira de músico de country & western para se dedicar exclusivamente ao rock; Little Richard e Chuck Berry já com seus primeiros compactos lançados; e Elvis Presley prestes a presentear sua mãe com uma gravação de sua voz feita na lojinha de Sam Phillips. Depois do sucesso de Elvis viria Carl Perkins e Jerry Lee Lewis, ambos com raízes no country, buscando aproveitar do recente interesse neste tal de rock ‘n’ roll.