Seja quem você quiser e se ame em primeiro lugar”, diz a MC Xuxú em verso de ‘Quero ficar’, canção que teve clipe lançado neste domingo, 14. O trecho representa bem a trajetória recente da artista mineira, conhecida em todo o país graças a ‘Um beijo’ — a música que manda “um beijo pras travesti” e virou mania nas redes sociais em 2013. Transexual e negra, a cantora se dedica à composição e interpretação desde a adolescência e tem feito de suas gravações, tanto no rap quanto no funk, veículos que dão voz a grupos sociais marginalizados e oprimidos — em especial lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros (LGBT).
No novo vídeo, ela assume o papel de noiva ansiosa. “Elas vão ter que aturar o estilo da preta/ Já vou logo avisando/ Hoje eu acordei perfeita”, declara Xuxú já nas primeiras rimas da faixa. A gravação de tom sensual usa sample de ‘Baby got back’, sucesso do rapper americano Sir Mix-a-Lot que também deu origem ao hit ‘Anaconda’, de Nicki Minaj. A mensagem de ‘Quero ficar’, contudo, vai muito além das brincadeiras usuais sobre conquista e vida noturna. O pano de fundo da composição, explica a autora, é a luta pelo direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo no Brasil.
“A gente mora em um país ainda muito preconceituoso, onde não temos o direito de casar. Eu quis dizer ironicamente: ‘quero me casar. Já que não posso casar, quero ficar'”, detalha a cantora. O discurso pela igualdade de direitos é tema recorrente nas gravações de Xuxú, que já militou em faixas como ‘Bonde das travestis’, sobre visibilidade trans, ou ‘Desabafo’, que aborda o universo homossexual. “Eu vim do rap e aprendi a tirar muito proveito do que eu canto, do que escrevo. Resolvi entrar na luta contra o preconceito”, declara ela, que se orgulha de “usar o microfone como uma arma para amenizar e, talvez algum dia, calar a opressão contra os LGBT”.
O vídeo
‘Quero ficar’ foi gravado em Juiz de Fora, cidade natal e berço artístico de MC Xuxú. Concebido e dirigido por Matheus Engenheiro, o clipe acompanha a preparação da noiva até a chegada à igreja. A cantora é acompanhada nas coreografias por madrinhas de casamento, interpretadas pelos dançarinos Wally Castro, Rodrigo Medsan e Jhonatan Souza. “Nasceu menino, vai usar azul. Nasceu menina, usa rosa. Eu trabalho para romper com esse tipo de opressão”, ela aponta.
O vídeo ainda conta com participação do rapper Mc Oldi, representante da cena musical juiz-forana. Letícia Gonçalves, organizadora da Marcha das Vadias de Belo Horizonte, foi convidada para assumir o papel da outra noiva. “Quando a gente idealizou esse clipe eu fiquei com medo de ter algo machista na minha letra”, admite Xuxú. A inclusão de Letícia no projeto deu à cantora a chance de acrescentar uma leitura feminista aos próprios versos. “Ela veio para me aliviar, para me dar mais certeza do que eu estava fazendo. Me deixou mais forte”, diz.
“Eu nunca tinha feito um trabalho especialmente para as lésbicas”, ressalta Xuxú, que encerra o vídeo celebrando a união com outra mulher. “Elas sempre me trataram com muito carinho nos meus shows. Estou fazendo essa homenagem a todas as lésbicas que me acompanham”, declara.