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"Humor e autocensura não combinam", afirma o comediante Diogo Portugal
No último mês, uma peça paulista acabou cancelada por conta do blackface, um antigo artifício cênico que pinta de preto os rostos de artistas brancos. O espetáculo A mulher do trem, do grupo Os Fofos Encenam, recebeu críticas pela internet e foi acusado de racismo. A produção sucumbiu e, pela primeira vez em 12 anos, a apresentação não aconteceu.
Na tevê, atrações como Zorra total perderam audiência ao preferir piadas leves e enredos amenos. O comediante Paulo Gustavo brinca com a figura do bêbado ao volante no stand-up Hiperativo, mas alerta o público que “não se deve dirigir ao ingerir bebida alcoólica”. Rafinha Bastos responde por alguns processos, por conta dos supostos excessos cômicos. Expressões como “preto”, “aleijado”, “bicha”, “gordo”, entre outras — tão populares em programas como Os trapalhões —, foram praticamente banidas dos palcos e telas.
Diante das controvérsias, pergunta-se: o politicamente correto está provocando uma censura geral ou evitando estereótipos preconceituosos? Ao limitarmos a arte, avançamos ou retrocedemos na liberdade de expressão? O humorista curitibano Diogo Portugal, um dos principais nomes do stand-up no Brasil, critica as imposições atuais: “A partir do momento que o artista começa a pensar muito no que pode ou não falar, acaba tirando a verdade do texto. Fica algo plástico. Humor e autocensura não combinam”, opina.
De acordo com o artista, alguns limites devem ser respeitados, mas isso não significa evitar assuntos tabus. “Creio que seja possível fazer humor com qualquer coisa. Depende apenas da dose de exagero aplicada à piada. Justamente quando entra o talento do comediante em surpreender a plateia”, sugere.
O ator, diretor e professor de artes cênicas da Universidade de Brasília (UnB) Fernando Villar parece seguir entendimento contrário. Na verdade, Villar questiona inclusive a própria utilização do termo “politicamente”. “Humanamente ou eticamente correto me parecem mais adequados, já que se trata de um cuidado em não querer ver nos outros o que não quer se ver em você. Um respeito ao próximo, à alteridade, à diversidade”, pontuou o professor, antes de acrescentar: “Se política fosse realmente o exercício da cidadania em prol da população, não questionaria o termo, mas não é o que vemos aqui”.