Pesquisadores não chegam a um consenso se ‘Pelo telefone’, composição de Donga que é considerada o primeiro samba da história, é de 1916 ou 1917, mas fato é que contar esses praticamente 100 anos de história num único musical é tarefa para lá de desafiadora. “Talvez por isso a ideia nem tenha sido minha”, brinca Gustavo Gasparani, escalado para escrever e dirigir ‘SamBRA’, que conta a história do gênero musical brasileiro por meio de vários de seus compositores e intérpretes, tendo o cantor Diogo Nogueira pela primeira vez também como ator. Depois de estrear no Rio de Janeiro e ser apresentado também em São Paulo, o espetáculo tem sessões sexta e sábado em Belo Horizonte.
“Precisamos fazer um recorte para colocar umas músicas e não outras. Cem anos dão personagens de sobra. Reli muita coisa e descobri, por exemplo, que o teatro de revista foi fundamental para o desenvolvimento do samba. Era um ponto de encontro. Veio-me, então, a ideia de contar essa história a partir dos espaços propagadores do samba, como a casa da tia Ciata, a Estácio de Sá, o teatro de revista, o rádio, o cinema, as boates de Copacabana, até chegar ao que considero o último movimento de transformação do samba, o movimento do Cacique de Ramos, com o partido-alto, o pagode”, diz Gasparini.
A geração de Diogo Nogueira, para ele, é muito influenciada por esse último ambiente. A sugestão do artista como nome principal do elenco (formado por 16 atores ligados ao samba) veio da produção do espetáculo, a cargo das empresas Musickeria e Aventura, que partiram de ideia do publicitário Washington Olivetto. São cerca de duas horas e meia de duração, durante as quais são encadeadas 70 músicas cantadas e 25 em formato de texto, contemplando João da Baiana, Sinhô, Carmen Miranda, Cartola, Clara Nunes, Paulo César Pinheiro, Noel Rosa, Chico Buarque, Martinho da Vila, Jorge Aragão, Beth Carvalho e Paulinho da Viola.
CRONOLOGIA
A narrativa é feita de forma quase sempre cronológica e, a respeito disso, o diretor do musical tomou alguns cuidados. “Para não ficar chato ou didático, o espetáculo começa com os atores convidando para conhecer a história do samba, cada um dizendo por que contribuiu para a evolução do gênero. Todo mundo disputando a paternidade da criança. No início é mais cronológico, depois fica mais afetivo. Noel Rosa, por exemplo, entra mais tarde, num encontro com Martinho da Vila, ouvindo Feitio de oração no rádio”, afirma. O espetáculo tem músicos que tocam ao vivo no palco.
“Eu me joguei de braços abertos”, resume Diogo Nogueira. Pela primeira vez ele pisa num palco como ator e diz estar tirando muito proveito da experiência, que tem lhe custado a interrupção quase total de sua carreira – depois de BH, ‘SamBRA’ segue para Salvador, Brasília, Porto Alegre e Curitiba. “Passei a ter percepção maior de presença no palco. Quando a gente conhece pessoas novas, aprende-se muito. Quando se está aberto para isso, a gente sempre leva algo para os outros trabalhos”, afirma.
A maior dificuldade, conta ele, foi decorar os textos. “Internalizei tudo no coração e um ator contratado para me ajudar contribuiu para que eu entendesse esse processo”, lembra. A rotina de ensaios foi de oito a 10 horas por dia, de segunda a sábado. A temporada do espetáculo em BH conta com promoção cultural do Estado de Minas.