Quais as motivações para ser religioso?

O Imparcial explica neste Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, 21, o que leva dezenas de pessoas a se tornarem religiosas

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Uma insana tentativa de explicar o sobrenatural através da existência de um ser transcendente, que não tem começo e não tem fim, que tudo sabe, que tudo pode, que tudo vê. Quem sabe, uma necessidade insaciável de compreender a si mesmo e as próprias escolhas. Ou, ainda, uma busca incessante por respostas sobre todos os problemas do mundo e, por conseguinte, o alcance da salvação eterna.

As motivações que levam muitos a procurarem alguma religião são diversas. Diferem dependendo das experiências e dos anseios de cada um. E são justamente essas diferenças que fazem surgir um dos maiores problemas sociais por que passa o Brasil: a intolerância em todos os níveis.

Hoje, 21 de janeiro, é o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. E motivados por essa data tão cheia de significados, O Imparcial buscou entender o que leva determinadas pessoas a serem religiosas. Se as pessoas buscam, tão avidamente, uma explicação para o inexplicável, o que as faz entrar em conflito quando encontram tal explicação? Afinal, o que é ser religioso?

Quem primeiro responde a esse último questionamento é a funcionária pública Alana Rodrigues, de 38 anos. Católica desde que nasceu, ela usa poucas palavras para tentar explicar o que é ser religioso. “Alguém que professa alguma doutrina, que segue preceitos e que vive de acordo com os dogmas da religião que escolheu praticar”, diz.

Quem complementa Alana é o engenheiro químico de 27 anos, Greyson Mendes. Protestante desde os 11, ele ressalta, ainda, que muitos que optam por não seguir nenhuma religião conseguem criar um ótimo relacionamento com Deus.

“Acredito que ser religioso tem a ver com seguir dogmas e princípios, não necessariamente tem que ver como ter um bom relacionamento com Deus. Uma coisa é eu ter minha comunhão com Deus, outra é eu professar minha fé em uma comunidade religiosa. Muitos escolhem não seguir nenhuma religião nem determinados dogmas, mas têm um ótimo relacionamento com Deus”, posiciona-se.

A estudante de Direito, Karla Dutra, admite ser uma das pessoas que não professam nenhuma religião. Para ela, não há necessidade de seguir liturgias e rituais para acreditar e se relacionar com Deus. “Eu acredito que consigo me relacionar com Deus de uma forma mais discricionária. Sem muitos rituais ou tradições religiosas, inclusive respeito aos que escolhem viver e acreditar dessa forma”, declara.

Trazendo uma visão mais científica sobre a religião, o sociólogo Álvaro Pires explica que essa manifestação antropológica surge como uma necessidade em conhecer os fenômenos misteriosos que estavam à volta do homem.

“Para entender, por exemplo, o desenvolvimento da agricultura, determinados homens criaram crenças que dariam sentido ao entendimento deste fenômeno no conjunto social. As ideias relacionadas com um Deus surgiram para dar conta,a princípio, dos fenômenos meteorológicos, surgindo, posteriormente a ampliação e a existência de diversos deuses. A religião possui o objetivo de estabelecer a relação do homem com o sagrado, com as dimensões cognitivas, simbólicas, significantes da história humana, a ser construída”, esclarece.

Ser religioso

Pai de santo, Lindomar. (Foto Honório Moreira)

A equipe de O Imparcial também foi atrás de representantes e devotos de várias instituições religiosas para falarem sobre suas crenças. Francisco de Paula é católico praticante e devoto de São José de Ribamar e de São Benedito, de quem fala com ternura, atribuindo ao beato o milagre da cura de uma grave doença que ele tinha.

“Eu tinha pancreatite. Estava num leito de hospital e somente orava dia e noite para ser curado. Foi então que senti um toque na região da minha barriga e, pelo manto, eu senti que era São Benedito que tinha me curado. Esse foi o primeiro milagre que eu recebi”, relata.

Quando questionado se acredita haver diferença entre ser religioso e ter um relacionamento com Deus, Francisco foi taxativo. “Não acho que tenha diferença porque Deus é só um Ele é pai de todos nós. Isso aí não tem dogma, não tem religião que diferencie. Se somos filhos de Deus, temos que pregar a fé e o amor”.

Para Raquel Macedo, que é Trabalhadora da Casa Espírita Chico Xavier, existe, sim, diferença entre ser religioso e ter um relacionamento com Deus. Segundo ela, a religião tem a ver com fatores mais externos e o relacionamento, com fatores internos.

“Ser religioso é estar ligado aos valores e às crenças, algo mais externo. Ter um relacionamento com Deus não está intimamente ligado com a religião, mas com algo interno, pessoal. Tem mais a ver com a maneira como você traz Deus para sua vida. Para o seu dia-a-dia”, comenta.

O Líder de Mordomia da Associação Maranhense da Igreja Adventista, Pr. Raimundo Ribeiro, também comenta sobre essa possível diferenciação entre religião e relacionamento com Deus. “Religião é religar, portanto, relacionamento é fundamental. Ser religioso é sim viver um compromisso espiritual com Deus, mas ao mesmo tempo, estar comprometido com um credo, com uma prática doutrinária”, pontua.

Sobre as próprias crenças, quem também falou foi o pai de santo Lindomar Barros. “Cada religião tem sua maneira de agradar a Deus, de estar diante dEle. Nós somos politeístas. Nós adoramos as divindades, as essências, a própria natureza. Seja Olodum, Orumilá, Jeová, Yaveh ou Deus, todos têm o direito de adorar a quem quiser”, exclama.

E a intolerância?

Durante a entrevista, o Pai Lindomar, como é chamado, lembrou com pesar, a situação que passou alguns anos atrás, quando uma filha sua foi vítima de intolerância. “Eu lembro que nós estávamos em um cortejo do Espírito Santo e uma filha minha, da minha casa, foi agredida brutalmente no rosto por uma evangélica simplesmente por ela estar vestida de imperatriz a cortejar o divino espírito consolador”, relembra. “Esse foi um período muito sufocante para nós, pois precisamos ir atrás dos nossos direitos, fomos à delegacia, fizemos várias romarias na delegacia por essa questão. E nós vivemos diariamente as várias faces da intolerância por várias partes da sociedade”, pondera.

O relato de Pai Lindomar vem carregado de consternação. Diariamente o Brasil mostra situações de intolerância, de desrespeito, de falta de sensibilidade e empatia. Mas, afinal, de onde vem tanta intolerância? Álvaro Pires aponta que a intolerância surge a partir das diferentes percepções que fazem parte do agir e do pensar do ser humano.

“A intolerância contra um tipo específico de religião, um tipo específico de pensar, um tipo específico de pigmentação da pele, um tipo específico de visão de mundo surge em função da diversidade de percepções que fazem parte do pensar e agir dos homens e mulheres, na construção de suas lógicas culturais. Infelizmente, sempre haverá pessoas inconformadas com o equilíbrio entre os cidadãos, apostando na diferença como arma destrutiva”, expõe.

Esperança

No Brasil, a discriminação religiosa é crime desde 27 de dezembro de 2007 e celebra-se o “Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa” em 21 de janeiro. Mas, bem mais que institucionalizar um crime, o caminho para combater a intolerância religiosa está no conhecimento e na propagação do respeito.

“Hoje, nós estamos brigando por aceitação. Algo que nem deveria mais acontecer. A sociedade precisa aprender a viver com as diferenças e aceitar o próximo. Só o que queremos é que nos respeitem dentro de nossas crenças”, conclama Pai Lindomar.

“O espiritismo nos esclarece sobre a importância de não julgar, de buscar entender o outro, mas também nos pede para ser luz onde quer que estejamos, ou seja, devemos respeitar as opiniões, mas não aceitar as injustiças”, bem lembra Raquel Macedo.

“O mundo precisa de mais amor, de mais alegria, de mais carinho. Não é de espadas, nem de guerras, nem de nada que incite o ódio. Quem opta por ser de umbanda, espírita, budista, evangélico ou católico, como eu, merece uma coisa somente: respeito”, expressa Seu Francisco de Paula.

“Os evangélicos trazem no próprio nome que carregam, uma grande mensagem: eles são mensageiros do Evangelho, das boas-novas. Se professamos o amor de Deus, como encontrar espaço para o conflito, para o desrespeito, para o ódio ou para a violência? Não tem a ver com o que difere, mas com o que une”, expressa Raimundo Ribeiro. Se as religiões, em seu cerne, buscam a elevação espiritual e a compreensão de si mesmo através da compreensão do outro, o que falta para desaparecer o desrespeito? A resposta é simples: falta mudar o homem!

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