Como é perigoso ser um “louco” nesta ilha!
RUY RIBEIRO MORAES CRUZ Psicólogo CRP 22-00582, Advogado OAB/MA 27106
Nos últimos meses, devido ao despreparo do Sistema de Segurança Pública e a fragilidade do Sistema Único de Saúde-SUS quando o assunto é Saúde Mental e as suas interfaces com as políticas intersetoriais, encontramos comportamentos inadequados da sociedade e dos servidores públicos sendo reinterados e resultando em morte de pessoas em surto psíquico.
Claro que os três casos, tem em seu contexto peculiaridades, que podem vir a serem elucidadas após o término dos inquéritos policiais, justificando a legítima defesa dos agentes públicos e dos populares indentificados que promoveram atos de linchamento. Entretanto, ao termos um olhar crítico encontramos a prevalência do desinteresse em atender os preceitos do SUS e assim contribuir para perpetuação dos ideais manicômiais.
Caro leitor, recordo que no primeiro caso a mídia notíciou que a Guarda Municipal foi acionada para atender ao pedido de uma clínica psiquiátrica privada, que por sua vez, foi socorrer uma família de um paciente que após alta, estava alterado e agressivo. O certo é que devido a demora assistencial do SAMU e riscos eminentes, foi disparado um tiro por um dos guardas e o paciente veio a falecer.
Já a segunda ocorrência em Paço do Lumiar foi fruto de uma desordem emocional de outro portador de transtorno mental, que em surto estava agitado e despido, tornando-se uma “presa a ser caçada” por populares. Após ser agredido, foi socorrido mas não suportou a gravidade dos ferimentos e veio a óbito.
A terceira vítima foi gravada perturbando o trânsito e produzindo danos a bens materiais, conforme o flagante da filmagem. Foi contido por meio de chutes, rasteiras e uso de spray de pimenta, sendo transferido por policiais ao Socorrão I, que literalmente fez um “desatendimento a sua integridade” pois este um jovem negro, permaneceu em crise, transformando-se logo em um risco por aqueles que deveriam oferecer cuidado e proteção.Segundo as informações das autoridades novamente a cena de desespero e despreparo se repetiu, fazendo com que um tiro fatal fosse deferido agora dentro do local especializado em salvar e prolongar a vida.
Ressalto que tais eventos descritos, podem pela falta de articulação de políticas públicas intersetoriais pautadas no cuidado e na ampliação da rede assistencial virem a ser revividos cotidianamente, pois facilmente vemos a população em situação de vulnerabilidade e em sofrimento psíquico é crescente nas proximidades das feiras, no centro da cidade, assim como nas vias próximas a praia Ponta D’ Areia e outros bairros independente das classes sociais.
Deste modo, compartilho a frase de autoria do Dr. Lopes Rodrigues, disponível no museu da Loucura, em Barbacena-MG que aduz “O que existe não são loucos perigosos. São lúcidos perigosos” com o intuito de convidá-los a refletirem se estas cenas de barbárie não são apenas pano de fundo de um paradigma ainda sedimentado em nossa sociedade, de perpetuar o conceito de segurança e controle social por meio da segregação, racismo e demais tipos de violências.
Por fim, ressalto a importância de compreendermos que os sistemas de garantias de direitos fundamentais em sua essência consideram estes transeuntes em desordem como sujeitos de direitos, merecedores de cuidado, proteção e dignidade.