A dança das cadeiras do emprego
Jogo muito comum nas brincadeiras infantis, a dança das cadeiras consiste em colocar uma música para tocar enquanto as crianças andam em torno de um círculo de cadeiras, que tem sempre um assento a menos do que o total de participantes. Quando a música é abruptamente interrompida, todos tentam achar um lugar e sempre há […]
Jogo muito comum nas brincadeiras infantis, a dança das cadeiras consiste em colocar uma música para tocar enquanto as crianças andam em torno de um círculo de cadeiras, que tem sempre um assento a menos do que o total de participantes.
Quando a música é abruptamente interrompida, todos tentam achar um lugar e sempre há alguém eliminado. Ao recomeçar a música, outra cadeira é retirada e a brincadeira prossegue até que surja um único vencedor.
A questão do emprego no Brasil vem sendo tratada de forma muito semelhante. A cada novo esforço para se criar postos de trabalho, a economia real parece retirar um número sempre maior de cadeiras. A grande diferença é que, em vez de excluir um participante de cada vez, esse jogo perverso transforma em excluídos do mercado formal de trabalho centenas de milhares de brasileiros.
Mas existe outra semelhança entre mundos aparentemente tão distantes como o dos jogos da infância e da busca por emprego na vida adulta.
Para algumas autoridades, parece que ambos os temas podem ser tratados da mesma forma perversamente lúdica. Enquanto o governo federal anunciava iniciativas bem-intencionadas, como o programa Primeiro Emprego, pouco se falava sobre os centenas de milhares de empregos desaparecidos no mesmo período. Ou mesmo da impressionante cifra de milhões sem carteira profissional assinada, atuando no mercado informal de trabalho.
Afinal, para cada nova frente de trabalho aberta, sabe-se lá quantas portas se fecham. Ficamos assim como ingênuas crianças, involuntariamente participando dessa dança das cadeiras.
É evidente que a geração de empregos não se faz por decreto, exigindo investimentos que superam a capacidade de qualquer iniciativa do Estado. Só o crescimento econômico sustentável é capaz de transformar a poupança, quando esta existe, ou atrair recursos externos e convertê-los em negócios concretos, que vão requisitar a contratação de mão de obra. Nesse cenário, soa leviano ou exercício de míope otimismo atribuir ao sensacionalismo da mídia a crescente preocupação com a falta de empregos no país.
Em vez de repetir velhos chavões de lideranças do Executivo no período da ditadura, os políticos democraticamente eleitos — e claro, toda sua equipe de governo — deveriam informar de forma transparente à sociedade brasileira qual a verdadeira agenda do espetáculo do crescimento, precocemente anunciado.
Os instrumentos para que haja uma reversão das expectativas no campo do emprego são de todos conhecidos. O país terá de gerar milhões de empregos nos próximos 15 anos, ou seja, no mínimo dois milhões de postos de trabalho a cada exercício.
E, para tornar viável esta meta, será necessário promover crescimento da economia de 5% a 6% ao ano, estimulando-se a produção, por meio de reformas estruturais urgentes. O Brasil precisa de um sistema tributário que seja motor e não freio da economia e de um sistema previdenciário que não represente privilégios para qualquer segmento.
A retomada consistente do mercado de trabalho é um cenário ainda muito distante do atual horizonte do Brasil. Ele continua sustentado por vagas de baixa qualidade. O rendimento mensal piorou e caiu 1,5% contra o trimestre passado.
A taxa de desemprego (IBGE) encerrou o trimestre de março a maio, 12,7% menor que o registrado no mesmo trimestre do ano anterior. Sem esse começo de conversa, qualquer comemoração será, no mínimo, inoportuna e voltaremos à nefasta dança das cadeiras, ao som das fanfarras que normalmente animam palanques populistas.
Continuaremos aguardando que a música sinistramente seja interrompida e com a sensação de que todas as cadeiras desaparecerão de uma vez.