Verbalizações e baixarias insalubres
Entre 1985, quando o último general do regime militar, João Batista de Oliveira Figueiredo, se despediu do Palácio do Planalto, e 2019, com a chegada do primeiro militar na democracia, o capitão da reserva do Exército, Jair Messias Bolsonaro, o Brasil passou por uma profunda mudança política, econômica e social. Foram 34 anos, com uma […]
Entre 1985, quando o último general do regime militar, João Batista de Oliveira Figueiredo, se despediu do Palácio do Planalto, e 2019, com a chegada do primeiro militar na democracia, o capitão da reserva do Exército, Jair Messias Bolsonaro, o Brasil passou por uma profunda mudança política, econômica e social. Foram 34 anos, com uma constituição novinha em folha, trazendo no seu bojo a democracia mais avançada da América Latina, nove presidentes da República e apenas um não eleito pelo voto popular – o maranhense José Sarney.
O Brasil viveu o período da democracia mais alongado desde a República. Porém, tem um passivo de dois impeachments presidenciais, vários planos econômicos e duas crises que abalaram ou destruíram as conquistas do povo brasileiro. Atualmente, o país passa por um período de adaptação aos rumos dados pelo presidente Jair Bolsonaro, com suas políticas de desmonte do que os antecessores do PSDB e do PT deixaram como legado. No governo do general Figueiredo, as frases que se tornaram célebres foram ditas por ele mesmo, tais como: “Durante muito tempo o gaúcho foi gigolô de vaca”, sobre as peculiaridades do Rio Grande do Sul. Ou: “Prefiro cheiro de cavalo ao cheiro de povo”. E mais ainda: “Se ganhasse salário mínimo, eu dava um tiro no coco”. Hoje o debate entre generais e um autoproclamado filósofo extrapola os mais rudimentares linguajares de torcida de futebol ou de bebedores de botequim da esquina.
“A quem me chama de desocupado, não posso nem responder que desocupado é o cu dele, já que não para de cagar o dia inteiro”, atacou o “ideólogo”, Olavo de Carvalho. Resposta do general Paulo Chagas: “O ânus é o órgão excretor, se faz sua função o dia inteiro, não é desocupado. Desocupado é o ânus do Olavo que foi substituído pela boca”.
É nesse ambiente verbalmente insalubre que o Brasil, com o governo militarizado, procura o rumo para esmagar a crise que está chegando ao 5º ano. O presidente Bolsonaro avaliza, no twitter, a postura do tal ‘guru’: “Olavo, rapidamente, tornou-se um ícone verdadeiro fã para muitos”. Classificou de “desentendimento” o arranca-rabo de Olavo com os generais que trabalham no entorno de Bolsonaro no governo. Bem que ele poderia recorrer ao acadêmico José Sarney para que eles aprendam um pouco de “liturgia do poder”.
Desde que o governo Bolsonaro assumiu o Planalto, em janeiro, o escritor, guru do presidente, desfere críticas azedas a militares, especialmente ao vice-presidente, general Hamilton Mourão, e ao ministro da Secretaria de Governo da Presidência da República, o general Santos Cruz. Na segunda-feira (6), o general Eduardo Villas Bôas, ex-ministro do Exército e membro do GSI onde assessora o general Augusto Heleno, publicou um duro texto sobre Olavo, dizendo que o escritor tem um “vazio existencial” e “derrama seus ataques aos militares e às FFAA, demonstrando total falta de princípios básicos de educação, de respeito e de um mínimo de humildade e modéstia”.
Em sua coluna ontem, na Folha de S. Paulo, a jornalista Mônica Bergamo revela a crise militar instalada em Brasília, diante das agressões de Olavo de Carvalho aos generais. “Os termos usados por ele, chamado também de ‘guru’ dos Bolsonaro, para se referir ao general Eduardo Villas Bôas, na terça (7), no Twitter, fizeram a temperatura entre os militares subir novamente”.
No gabinete da Vice-Presidência, a ordem era nada comentar para não elevar a crise a níveis imprevisíveis, dado o inconformismo dos militares com o apoio de Bolsonaro ao guru. No segundo escalão militar, que lota os gabinetes de ministros, a indignação era a mesma. Em mensagens, coronéis se referiam às atitudes de Olavo de Carvalho como “favelagem”. Anteontem, Olavo voltou a fustigar o vice Mourão, que preferiu ponderar: “ataques são totalmente sem nexo”.
Em sua trincheira na cidade de Nova Iorque, protegido pela distância cibernética, escritor não cansa de disparar mísseis contra o miliares do governo: “Os generais, para voltar a merecer o respeito popular, só têm de fazer o seguinte: arrepender-se, pedir desculpas e passar a obedecer. O Santos Cruz, politicamente analfabeto, não sabe nem mesmo a distinção entre governo e Estado. Quem governa é o presidente sim, Santos Cruz”.