BASTIDORES

A tragédia do desrespeito à educação

Penso que um ministro da Educação deva ter ao menos duas qualidades, o que também não considero que seja exigir muito: entender de educação e gostar de educação. O currículo do senhor Abraham Weintraub revela que ele não atende à primeira premissa, adequando-se mais ao cargo de ministro da Economia.  No entanto, como não domino […]

Penso que um ministro da Educação deva ter ao menos duas qualidades, o que também não considero que seja exigir muito: entender de educação e gostar de educação. O currículo do senhor Abraham Weintraub revela que ele não atende à primeira premissa, adequando-se mais ao cargo de ministro da Economia. 

No entanto, como não domino a área econômica, prefiro não emitir opiniões sem fundamentação alguma, pois isso frequentemente ofende pessoas. Contudo, ainda poderia haver esperanças de que o ministro da Educação demonstrasse gosto pela educação, afinal, como diria o patrono da educação brasileira, que também parece não agradá-lo, o educador “lida com gente e não com coisas”. 

Daí por que me indigna ver o ministro da Educação se dirigir à Comissão de Educação do Senado Federal para classificar a expansão do ensino superior ocorrido no Brasil como uma “tragédia”. Estando presente em um câmpus criado em 2006, no início do Reuni, na periferia de Brasília, ouço isso como um desrespeito de dimensões muito maiores que possivelmente o próprio ministro possa ter ponderado.

É óbvio desrespeito a todos que passaram pelo seu cargo e que, independentemente das disputas eleitorais, compreendem a defasagem histórica de acesso da população brasileira ao ensino superior, como também acompanham seu processo de expansão em todo o mundo. Afinal, vivemos na era do conhecimento, e os países que ignorarem esse fato serão destinados a prover o mundo desenvolvido de matéria-prima e trabalho de baixa qualificação.

O desrespeito atinge também os trabalhadores do governo federal, sobretudo do próprio Ministério da Educação, que tanto lutaram para viabilizar a expansão que tem dimensões reconhecidas internacionalmente e orgulha os responsáveis pelo feito. 

A fala do ministro desrespeita reitores, conselhos universitários e equipes de gestão das universidades que se debruçaram em projetos de criação dos câmpus, dos novos cursos, ponderando as possibilidades e riscos, e trabalhando arduamente para a sua viabilização.

Desrespeita os professores e técnicos que fundaram câmpus de universidades federais em localidades distantes dos centros urbanos e de suas reitorias, assumindo desafios até então inéditos no âmbito do ensino superior público no Brasil.

Mas o mais grave desrespeito é com a população brasileira, sobretudo a mais pobre. É com a juventude que essa camada pode finalmente acessar uma parte do ensino público que historicamente era quase exclusivo das classes mais abastadas. A mudança do perfil do estudante da universidade pública no Brasil, a partir da expansão, está descrita em artigos publicados dentro e fora do Brasil e acessíveis para quem se dispuser a lê-los.

Quero crer que tanto desrespeito não tenha sido o objetivo do ministro, mas a consequência de sua falta de conhecimento de causa, o que tem sido recorrente no governo federal em 2019. Pergunto-me se o ministro da Educação conhece uma mínima parte que seja dos câmpus construídos no processo de expansão das universidades federais. Se tem conhecimento do impacto dos projetos de extensão e das parcerias das universidades com setores locais da sociedade nos municípios onde se instalaram. Se, conhecedor da área econômica, avalia o impacto dos recursos federais no desenvolvimento local, não apenas na renda per capita, mas também no desenvolvimento humano em suas diversas possibilidades.

Se já olhou nos olhos da juventude recém-formada em uma universidade federal na condição de primeira pessoa da família a ter acesso ao ensino superior de alta qualidade. Se conceberia pensar no significado da mudança social que é para aquela família ter gente formada nesses termos, com outras possibilidades culturais e de acesso ao trabalho, pois não é apenas na educação básica que se muda a sociedade, mas é exatamente no acesso ao curso superior que o jovem mudará a condição social, o que deverá interferir em toda sua família e descendentes.

Nosso país precisa investir em educação em todos os níveis e possibilidades. Um ministro da Educação que entende e gosta de educação sabe que a solução para a melhoria da área no país não passa por criar disputas entre os diferentes níveis de educação, muito menos por se posicionar como adversário de universidades ou escolas, mas de fazer o dever de casa, que é lutar internamente no governo do qual participa para conseguir mais e melhores condições para todos os níveis da educação.

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