Por que o Maranhão abandona seu maior patrimônio? (1)
O Maranhão de hoje não sabe fazer jus aos maranhenses talentosos de ontem. O Maranhão não se autorreconhece
Era 1º de março de 2015. Eu sabia que, naquele dia, a cidade do Rio de Janeiro, capital do estado brasileiro de mesmo nome, estaria completando exatos 450 anos. Nesse dia, na página principal de apenas um “site” de notícias (o UOL), a expressão “CIDADE MARAVILHOSA” aparece pelo menos sete vezes em manchete e títulos de textos. “Cidade Maravilhosa”, como se sabe, é uma figura de linguagem (chamada perífrase ou antonomásia ou epíteto) para denominar a cidade Rio de Janeiro, Essa expressão — “Cidade Maravilhosa” –, de tanto que “pegou”, é nome de música, de 1934, depois considerada hino oficial do município carioca: “Cidade Maravilhosa / cheia de encantos mil…”. Também é nome de programa de rádio, de título de livro (tenho um exemplar de obra com esse nome, do começo da década de 1920, de autoria de Olegário Mariano, pernambucano que morava no Rio). Enfim, no Brasil e no mundo, é automático: “Cidade Maravilhosa” é sinônimo de “Rio de Janeiro”. Um septassílabo por um tetrassílabo, 17 letras por 12.
Pois bem: antes da data de 1º de março de 2015, havia dias que a grande Imprensa (rádio, jornal, televisão, “sites”), sobretudo a do Sudeste, vinha fazendo e divulgando matérias sobre o Rio de Janeiro e seus 450 anos. Invariavelmente, a expressão “Cidade Maravilhosa” estava ali, naqueles textos. “Cidade Maravilhosa” é a expressão-alma que dá “vida” ao nome-corpo “Rio de Janeiro”.
O que não vi, não li, não escutei foi a referência, mínima que fosse, a quem é, senão o autor, o grande divulgador da expressão “Cidade Maravilhosa” como perfeita substituta, dublê de corpo e alma de “Rio de Janeiro”.
Pois o maior divulgador da expressão “Cidade Maravilhosa” é um maranhense multitalentoso – como o eram diversos maranhenses, sobretudo escritores, que, individualmente ou com a família, se mudaram para a antiga Capital Federal, o Rio, em especial no século 19.
O grande divulgador da expressão “Cidade Maravilhosa” é o maranhense de Caxias Henrique Maximiano Coelho Netto, que surpreendeu e encantou o Brasil com suas dezenas e dezenas de livros e milhares e milhares de textos. Não é sem razão que foi eleito “Príncipe dos Prosadores Brasileiros” e três vezes indicado ao Prêmio Nobel.
O Maranhão de hoje não sabe fazer jus aos maranhenses talentosos de ontem. O Maranhão não se autorreconhece. Não adotou um pingo de sadia ousadia, de criativa audácia, para (im)pôr-se em seu lugar, como nota altissonante, no concerto da Federação. Falando no geral, pergunte-se a um estudante maranhense ou a outro cidadão a escalação do seu time de futebol (geralmente paulista ou carioca) e ele lhe poderá detalhar até como deram os passos e passes que culminaram no terceiro gol do segundo tempo no campeonato tal do ano de mil e novecentos e lá vai fumaça. Genial. Louvável. É o amor ao futebol.
Agora, pergunte-se que (enorme) diferença fez no Brasil ou no mundo escritores, cientistas, artistas, gestores públicos e políticos nascidos em muitos casos nas brenhas da hinterlândia maranhense, muitas das vezes com todas e aparentes pré-condições para darem errado na vida, pela soma de negativos fatores socioeconômicos, educacionais, familiares, territoriais…
Maranhenses que causariam orgulho aparente, explícito, e não apenas latente, potencial, a cidades como Paris, a países como a França… Mas esses nossos irmãos não mereceram até hoje dos setores Público e Privado um conjunto de ações sistêmicas e sistemáticas, orgânicas e organizadas para, até mesmo, (re)validar nossa “fama” de “Atenas Maranhense” e (re)ativar ou inspirar espíritos conterrâneos para os valores e validade da Cultura, da Arte, da Educação, do Conhecimento, da Ciência, da Literatura, da (boa) Política etc.
Dá vergonha ou, mais ainda, tristeza, saber o pouco conhecimento ou o quase nenhum reconhecimento ao tanto de esforço, tempo, talento e outros recursos que homens e mulheres maranhenses despenderam em nome de uma coisa, em defesa de uma causa. Conterrâneos maranhenses que têm recebido muito mais reconhecimento e homenagens em solo não maranhense do que na própria terra em que nasceram.