opinião

O retorno da barbárie

Aureliano Neto – Membro da AML, AIL e AMLJ · aurineto@hotmail.com

O mundo está em perigo. A culpa é de quem? Numa resposta simples, bem resumida, sem necessidade de maiores análises, diria que é de todos nós. Caminhamos pela história, somos os autores da história, mas aprendemos muito pouco com a história. Ou, se aprendemos, não pomos as lições em prática, como consequência, misturamos alhos com bugalhos. 

E uma dessas misturas cruéis é a confusão que se faz entre democracia e o exercício autoritário do poder, que nada tem a ver com Estado Democrático de Direito, ou ainda a mistura do exercício da democracia, que tem limites legais, previstos em normas constitucionais, e o exercício do poder sem esses limites, ou com supostos fundamentos, ainda que de conotação religiosa, uma vez que o Estado, como forma legal de exercício de poder, não tem religião: é leigo.

A história nos conta que o mundo viveu a Idade das trevas e a era das luzes. Esta fase marcada pelo pensamento iluminista, centrado nos postulados da igualdade e da fraternidade. Em decorrência, o exercício do poder ao longo do tempo deixou de se basear em vontades pessoais. As nações desse novo mundo regem-se por normas legais – as constituições – que harmonizam e garantem um curso à sociedade livre de retrocessos civilizatórios, fundado no respeito humano e no desenvolvimento socioeconômico. Mas, acentue-se: desenvolvimento não apenas econômico, que alcance tão-só parcela minoritária da sociedade, representada pelo famigerado mercado. Não há dúvida de que o governante pode elencar suas prioridades e trabalhar para executá-las, porém não deve e não pode violar certos princípios humanísticos consagrados, como o de respeitar a dignidade da pessoas humana, sendo este um dos básicos princípios – e cito como exemplo – da Constituição da República Federativa do Brasil, insculpido no inciso III do art. 1º da nossa Carta Magna.

Um dos maiores problemas vivenciados nos dias atuais está em governos autoritários, travestidos de democratas. Esses governos, caracterizados pelo autoritarismo, vilipendiam todos princípios conquistados e consagrados no avanço da árdua construção de um mundo mais igual e fraterno. Esses governantes – democratas falaciosos – impõem a força e o poder econômico para ditar as suas diretrizes desumanas, mas que atendem aos autoritários interesses do capitalismo financeiro dominante. Tentam se justificar nessa prática genocida, mesmo quando apóiam e incentivam as guerras, com substanciosos gastos econômicos, pondo em situação de grave perigo a humanidade. Nesse caminhar destrutivo, até grupamentos terroristas alegam almejar a paz – a paz por eles idealizada -, ainda que mediante atos de violência extrema.

Poder-se-ia estar num mundo bem diferente, distante da barbárie. Com as ideias iluministas, a humanidade avançou. Hitler e Mussolini ficaram no passado, ainda que recente. A Segunda Guerra Mundial apontou outras alternativas de convivência num mundo multipolarizado. A Guerra Fria representou apenas um momento de conflito preocupante. Os governos ultrapersonalistas, firmados na figura de um imperador, ou de um presidente, foram rechaçados pela história. Napoleão, Hitler Mussolini estão sepultados no passado da história. Não se pode admitir o predomínio da personalidade sobre os destinos de um povo, ou da humanidade; é inaceitável no Século XXI, como já deveria ter sido nos séculos que findaram. Nada obstante, vive-se um momento crítico, de práticas indignas, desumanas, eis que o país mais poderoso do planeta – ou que assim se diz -, por seu aparato bélico nuclear, antes de tudo, elege um novo e antiquado imperador para comandá-lo; alguém cuja personalidade, como se tem nitidamente percebido, é, claramente, a de um psicopata. Para aonde vai a humanidade? O exercício do poder, em todos os sentidos, internos ou externos, é feito com limites. E um desses limites é o respeito infinito pela dignidade da pessoa humana. De outro modo, não há que se pensar, e muito menos, na existência de uma sociedade, ou de uma pluralidade de sociedades, diferenciadas pelos seus valores culturais.

Rubens Casara, no seu livro Sociedade sem Lei, pós-democracia, personalidade autoritária, idiotização e babárie, Editora Civilização Brasileira, 2018, refere-se ao exercício do poder e afirma que poder, conceitualmente, é a possibilidade de produzir efeitos, inclusive sobre o outro. Mas é preciso ter cuidado com o exercício desse poder, que é limitado ao respeito aos direitos fundamentais, a fim de que não se tenha o retorno à barbárie fascista e nazista, personalisticamente representadas pelos ditadores Hitler e Mussolini, que enlamearam a história da humanidade, embora, no exercício insano desse poder, tivessem a apoio da maioria da população alemã e italiana, que não teve o cuidado de perceber que não basta atender aos interesses e desejos de maiorias de ocasião, para assegurar-se que os fundamentos do Estado de Direito estão sendo respeitados, como a fraternidade, a dignidade da pessoa humana, além de todos os demais direitos fundamentais, consagrados nos já referidos avanços que tivemos no curso da nossa história. Não sendo assim, caminhamos celeremente para o mundo da barbárie, com prevalência do autoritarismo da força bruta, como querem esses novos governantes, com velhas e autocráticas ideias.

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