Desvalor do Trabalho como força Emancipatória
Aureliano Neto – Membro da AML, AIL e AMLJ · aurineto@hotmail.com
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Por que existe o trabalho? Decorre de uma necessidade do trabalhador, para suprir suas necessidades pessoais e familiares, ou do sistema produtivo/capitalista, para atender ao mercado de consumo? A luta do trabalhador tem sido intensa e permanente. O salário é insuficiente. Mal dá para manter-se a si mesmo e à família, e isso não só para alimentação do dia a dia, mas para educar os filhos. E, no sistema econômico neoliberal, que caracteriza a essência do capitalismo, o trabalho é invisibilizado, e recebe um tratamento menor, ou de pouca relevância, sobretudo quando o sindicato da classe trabalhista assume a luta pela melhoria da vida do trabalhador. O mercado impõe a sua visibilidade soberana, porque é o que ostenta o poder econômico. A este respeito, faço referência a uma interessante passagem do texto Morte ao trabalho!, de autoria do professor Juarez Guimarães, publicado em 5/8/2022, no site A Terra é Redonda, no qual analisa a genealogia da negação do trabalho, ao se manifestar didaticamente: “O tema de como enfrentar os sindicatos foi desde sempre central na origem e na formação do neoliberalismo. Entre 1947 e 1959, foi o terceiro tema mais debatido nos seminários da Sociedade Mont-Pèlerin. Havia uma divisão de opinião entre os participantes: os ordoliberais alemães mais inclinados a formar sindicatos de orientação liberal, integrando-os funcionalmente à ordem capitalista: outros, que acabaram prevalecendo, a favor de uma estratégia elaborada de contenção e neutralização dos sindicatos. Friedrich Hayek posicionou-se firmemente a favor destes últimos. Para ele, os sindicatos seriam uma ‘perversão na ordem espontânea do mercado e uma exceção frente à ordem legal’ que deveria organizar o chamado ‘livre mercado’.” Nessa dicotomia entre mercado e trabalho, tem prevalecido o poder do primeiro. O trabalhador, para avançar na sua árdua luta pelas conquistas de direitos, come o pão que diabo amassou. Friedrich Hayek, pensador liberal, cujas ideias prevaleceram no passado e ainda prevalecem, adotava posições absolutamente contrárias aos interesses do trabalhador, representado por
sindicatos. Juarez Guimarães faz referência nesta passagem esclarecedora: “A linha de ataques aos sindicatos era extensa, como mostra o capítulo XVIII do livro A constituição da liberdade, de Friedrich Hayek. Os sindicatos causavam rigidez e uniformidade dos salários em detrimento das diferentes capacidades e produtividades; geravam ramos privilegiados de trabalho, sem relação com a produtividade; a elevação dos salários para além do nível do “mercado livre” produzia uma constante e crescente inflação; o uso de piquetes, as filiações involuntárias em razão de contratos generalizáveis, a existência de sindicatos para além das fábricas, a manutenção de vínculos com os sindicatos por não empregados, tudo visto como inaceitável em uma sociedade de ‘livre mercado’. A ideia de uma ‘democracia industrial’ na qual sindicatos teriam voz ativa nas políticas da empresa deveria ser banida.”
Em dedução que se evidenciar na história, democracia, nessa espécie de relação entre o capital e o trabalho, não existe. Negociação, também não; apenas imposição. Prevalência: a força do livre mercado. E o trabalhador que dê o seu jeito.
Num texto interessante, publicado no site A Terra é Redonda, em 8/7/2022, de autoria de César Sanson, professor de Sociologia do Trabalho, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no exame que faz da teoria marxiana, esclarece o mestre riograndense do norte que “Marx, (…), reconhece o trabalho como essência da atividade humana, mas critica no que ele se transformou com a chegada do modo de produção capitalista e desde o início dos seus estudos em economia política, abandona o trabalho como um dado antropológico e o identifica como lugar da miséria humana.” E mais adiante alguns tópicos bem esclarecedores: “O capital(ismo) em Marx é um ‘mundo invertido’ em que as relações sociais são relações entre as coisas, e essas coisas são mercadorias. Como destaca Jan Spurk,[1] ‘os seres humanos criam suas relações sociais coisificadas e são dominadas pelas coisas, a saber, as mercadorias’. (…)O trabalho não produz emancipação, produz subordinação, exploração, alienação e estranhamento.” A conclusão é simples: o trabalhador não faz parte do processo capitalista,
apenas trabalha; o trabalhador não é para ter vida boa, e muito menos ficar rico, mas vive para trabalhar.
Por essas conclusões, quando o trabalhador se organiza para lutar pelos seus direitos, pleiteando melhoria do ganho salarial, para poder viver um pouquinho melhor, logo o mercado, através dos seus porta-vozes, grita aos quatro cantos, em alto e bom som, que o movimento reivindicatório causa graves prejuízos à sociedade. Mas qual sociedade? A do dono do capital, que não abre mão do seu lucro, embora o acumule às custas do suor do trabalhador? ?
A situação é grave. Todos sabemos, porque sentimos. Neste nosso Brasil, arranhado por golpes e mais golpes, já se cogitou em extinguir a Justiça do Trabalho. Se o trabalhador, o único interessado, não abrir os olhos, fatalmente os nossos capitalistas, liderados por Elon Musk, o deus do dinheiro e das fakes news, assumirão, em benefício próprio, essa iniciativa deletéria, inserida no bojo do pretendido semipresidencialismo. E o monarca Trump, de logo, emitirá uma das suas Cartas Régias, para beneficiar aqueles que o adoram, apesar do sofrimento dos imigrantes, presos sem culpa, cruelmente algemados e deportados.