Bate outra vez… com esperanças o meu coração…
Aureliano Neto – Membro da AML e AIL · aurineto@jhotmail.com
Bem. Como diz a sabedoria popular, a esperança é última que morre. Como o mar não anda bem pra peixe, seguro-me, com a firmeza dos crédulos, nesse fio de esperança. No curso dessa nossa conversa, esclarecerei, isso pra não dizer que falarei apenas de flores, embora esse tema, numa semana após as eleições municipais, fosse poética e maranhensamente mais agradável, do que está repetindo as lições imorais do cantado e decantado Pablo Marçal, adorado por muitos e odiados por outros tantos, que o que faz com que o nosso sensível coração bata outra vez com esperanças. Mas deixa pra lá. Contarei uma historinha que deu origem a esse poético verso dessa linda música popular brasileira, As rosas não falam.
Cartola, autor desse consagrado samba, casado com D. Zica da Mangueira. Ela, companheira fidelíssima e uma das musas da Verde-Rosa – a Estação Primeira – e ele, o menestrel do samba, sempre com o seu violão compondo em poesia o amor e a vida nos barracos do morro. Todos esses personagens foram poeticamente retratados por Rildo Hora e Sérgio Cabral – muito cuidado: o pai, e não o filho, que ficou rico a custa do alheio – no célebre samba Os menisnos da Mangueira, interpretado por Atualfo Jr., filho do não menos célebre sambista Ataulfo Alves, que deixou obras-primas obrigatórias em todas as galerias da música popular brasileira.
O certo é que D. Zica, sendo repetitivo, figura lendária, assim como foi D. Neuma, da Mangueira, gostava de cultivar, com finalidade ornamental, rosas. E cada vez se expandia em colorida beleza. Ela perguntou a Cartola por que acontecia aquilo. Cartola respondeu: não sei, Zica, as rosas não falam. Dessa espontânea resposta veio a inspiração do samba As rosas não falam, cuja força poética o tem mantido eterno durante todo esse tempo da sua existência. É uma obra de arte e, por ser, como ocorreu com tantas
canções brasileiras, será inesquecivelmente lembrada, porque arte é arte e não morre.
Conta a história que Cartola compôs As rosas não falam para que Roberto Carlos fosse o seu intérprete. À época, o Rei da Jovem, Guarda, autor de grandes sucessos e de eternas canções, não quis cantar esse fenomenal samba de Cartola, sob a simples alegação de que O Rei conversa com as rosas, mantendo com elas um colóquio de intimidade.E, por essas razões sentimentais, não consta que tenha cantado ou mesmo falado com as rosas. Mas isso é uma questão poética. Só os poetas é que têm o poder da sensibilidade de encontrar a solução no mundo da poesia. Cartola, que já se encontra descansando no túmulo dos grandes poetas, nos deixou um acerto de canções que enriquece o mundo do samba. De todas a minha preferida continua sendo As rosas não falam. Os seus versos – sublimes, eternamente sublimes – dizem o que só os poetas sabem dizer: “Bate outra vez Com esperanças o meu coração / Pois já vai terminando o verão / Enfim / Volto ao jardim / Com a certeza que devo chorar / Pois bem sei que não queres voltar / Para mim / Queixo-me às rosas / Que bobagem as rosas não falam / Simplesmente as rosas exalam / O perfume que roubam de ti, ai / Devias vir / Para ver os meus olhos tristonhos / E, quem sabe, sonhavas meus sonhos / Por fim.”
Pois é. Nestas eleições, a força poética de que As rosas não falam, de Cartola, bateu com bastante força no meu coração. Ao tempo, deu-me uma certa esperança, principalmente no pleito eleitoral de São Paulo, onde em algum meio de comunicação percebi subliminarmente alguma escassa torcida ao ignorante do Pablo Marçal. Mas,
ainda assim, na expectativa do resultado, percebia que o meu coração batia com esperanças e repetia intimamente os primeiros três versos iniciais desse poeta do Morro da Mangueira: “Bate outra vez / Com esperanças o meu coração / Pois já vai terminando o verão / Enfim.” Parei. Pensei. Parodio o resumo Cartola e o exalto na sua poética: Volto ao jardim. Na certeza de que o 2º turno seja um debate de ideias, temperado de amor, fraternidade, com propostas de obras sociais, respeito ao ser humano, menos, muito menos dinheiro, o mal dos nossos tempos, a tragédia anunciada.