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Direito de morrer com dignidade: uma reflexão neste Dia dos Pais

Artenira Silva é professora titular da Universidade Federal do Maranhão, pós-doutora em Psicologia e Educação pela Universidade do Porto- Portugal (2014). Graduada pela Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Mestre em Saúde e Ambiente pela Universidade Federal do Maranhão (2000) e Doutora em Saúde Coletiva pela Universidade Federal da Bahia (2005).

Artenira Silva e José Arteiro da Silva. (Foto: Arquivo Pessoal)

José Arteiro da Silva, idoso, 85 anos, portador de Alzheimer avançado, com várias comorbidades e três internações hospitalares em menos de trinta dias. Interditado. Figura pública no estado do Maranhão. Vida profissional de incontestável contribuição social. Pai de nove filhos.

Esta figura pública ímpar vem nos ensinando a importância de nos atermos a estudar e compreender a amplitude e a complexidade de duas das mais importantes normativas nacionais especializadas: o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto do Idoso. Ambas se prestam, como fim último, a garantir a dignidade da pessoa humana àqueles que são mais vulneráveis em âmbito familiar, respectivamente infantes e idosos, uma vez que os adultos que deles cuidam nem sempre favorecem o que de fato define o melhor interesse de ambas as categorias.

Semelhantemente ao ECA, o Estatuto do Idoso amplia o conceito de vulnerabilidade, que vai muito além da econômica, sem negá-la obviamente. Vulnerabilidade nas duas normativas está atrelada à impossibilidade das categorias protegidas poderem expressar clara e autonomamente o que lhes causa ou não sofrimento, em especial psicológico, cujo poder de consequência é irreversivelmente inconteste.

José Arteiro da Silva, em seu processo de morrer, aprendemos a ressignificar conceitos muito importantes e muito longe de serem simplistas: vulnerabilidade, dignidade e autonomia da vontade em contexto de hiposuficiência psicológica, mesmo sem que se esteja diante de uma situação econômica de vulnerabilidade.
A última grande lição de vida do homem, gigante, José Arteiro da Silva, pode ser fragmentada em núcleos de significação muito importantes, todos atravessados por áreas do saber distintas, da saúde ao direito, requerendo sempre um olhar de humanidade, perpassando questionamentos comuns a todos nós que vivenciamos o processo de morrer de alguém a quem amamos.

Pode-se pleitear que um idoso psicológica e mentalmente vulnerável, pela patologia que o acomete, tenha garantido algum direito à autonomia de vontade? Em que medida um idoso com o quadro clínico de José Arteiro pode ou deve ter sua vontade respeitada? Deve ter sua alimentação definida considerando-se suas necessidades de saúde e preferência pessoais? Deve manter uma rotina que lhe seja aprazível e compatível com seus gostos e preferências pessoais? Deve ter ele o direito de ser cuidado por profissionais com expertise, sem improvisos, dada à sua condição de não ser hipossuficiente econômico? Pode ele ser obstado do convívio presencial ou dos contatos por videochamadas com qualquer um dos seus nove filhos ou netos? Que omissões ou ações podem ferir a dignidade humana de um idoso no fim de sua vida e em que medida sua autonomia de vontade pode e deve ser mantida e defendida?

Diante de estar vivenciando seu momento final, a vida deste gigante faz refletir, edifica, revoluciona e ensina: a autonomia da vontade de idosos acometidos por Alzheimer, logo, em vulnerabilidade psicológica, deve ser respeitada, jamais deles afastando qualquer filho e garantindo aos mesmos o que há de mais digno em saúde e em qualidade de vida.

página de opinião do O Imparcial deste sábado (10). (Foto: Banca O Imparcial)
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