Opinião

Efeito Germano

Antônio Nelson Faria – Jornalista

Para quem não lembra ou não conheceu, Germano foi dono e mestre cuca da Base do Germano, um dos principais pontos da gastronomia e da boemia local, instalado no antigo bairro da Macaúba e que depois migrou para a Camboa. Gostava de ser identificado como proprietário do negócio e ditou regras e vastos conceitos de como tratar, sem esmero ou atenção, o seu imenso público. Muito distante do manual da boa etiqueta, introduziu o modelo de atendimento Germano que rasgava todos os princípios direcionados ao bom trato do cliente.

Sua extremada falta de savoir-faire contrastava-se à saborosa e espetacular Caldeirada de camarão servida na sua Base, regada a cerveja ou a bom uísque. Como o bom tratamento não era o prato principal da casa, o mau humor de Germano oscilava conforme a ocasião, sem nenhuma preocupação com a elegância ou o requinte. Recebia o seleto público de bermuda e camiseta de estilo português e ditava as normas de como seus clientes deveriam se comportar no seu espaço.

Criou no seu estabelecimento regras especiais que se espalharam ao longo dos tempos em muitos bares afora da nossa cidade boêmia e magnetizada pelo bom atendimento. A sua casa recebeu ilustres como o ex-prefeito Haroldo Tavares, um dos descobridores do local e comensais atraídos pelo sucesso do prato carro-chefe do restaurante. Os discos mais tocados eram os boleros de Bienvenido Gandra, a orquestra de Waldir Calmon(autor da clássica trilha do jornal da tela “Canal 100”, de Carlinhos Niemayer) e astros da bossa nova e da mpb.

Fato inédito foi a passagem da turma do jornal O Pasquim(Ziraldo, Millôr, Chico Buarque, Fortuna e companhia limitada) em tarde de grande tiroteio etílico. Dos frequentadores mais assíduos destacam-se Jomar Moraes, Bernardo Almeida, Luís Alves(Papagaio),PH, Luiz Raimundo Azevedo, Murilo Sarney, Manoel Ribeiro, Murilo Ferreira, Luís Augusto Cassas, Jesus Santos, este cronista e outros tantos letrados os quais não lembro.

Para impor ordem ao ambiente, Germano espalhou placas esdruxulas pelo salão com os seguintes dizeres: “É proibido tamborinar na mesa”; “Não é permitido bulir na radiola”; “Respeite! Minha família mora aqui” e outras pérolas que o vento levou. Só faltou, a clássica mensagem exibida em bar do João Paulo, perto do Buraco do Tatú, que estampava “Não Aceitamos cheque sem fundos”.

Feliz foi Jaime Souza, o famoso Jaime “Cú” Suado, morador da rua da Paz no palacete que abrigou posteriormente o Unibanco. Homem de posses abriu um bar, se não me engano na mesma rua, para atender somente aos amigos.

Na entrada constava enorme cartaz anunciando em letras garrafais: “Aqui, o freguês nunca tem razão”. Talvez tenha sido aí que Germano achou a sua grande fonte de inspiração. O bar não demorou para fechar definitivamente as portas.

Um dos melhores discípulos de Germano foi o califa pindareense Elias Haickel que por muito tempo foi dono do Ali Babá, trailer de lanches árabes em frente aos saudosos supermercados Lusitana/Bom Preço, no São Francisco. Elias, suspendia o atendimento aos clientes nos dias de shows televisionados do seu ídolo Roberto Carlos e reclamava se o cliente pedisse seguidamente cervejas, quibes, esfirras ou outros itens do cardápio, porque dava muito trabalho abrir o freezer ou se deslocar até as mesas. Por incrível que pareça, a lanchonete funcionou por quase quinze anos.

Cadeado, dono do bar do mesmo nome, no Olho D’Água, era arreliado. Brigava se fosse obrigado a levantar da cadeira. Já no Bar da Rosa, no mesmo bairro, o único tira-gosto era sardinha ou fiambrada em lata. Quando alguém reclamava a dona disparava que não cozinhava para o marido, imagina para cliente. O Basílio, na Feira da Praia Grande, servia todas as cervejas, contando que fosse da marca CERMA.

No Pelicano, na Litorânea, o casal abençoado Gilson e Marilia convocava a vasta clientela a debandar as 20 horas, impreterivelmente. A Barraca do Henrique, na mesma orla, cessava o atendimento as 6 da tarde, fizesse forte sol ou intensa chuva. No Léo, no Vinhais, ícone dos bares ludovicenses, nunca ouse pedir música ou substituir a que está sendo executada. No Pioneiro, o chefe Paulo, normalmente ressuscita as práticas e efeitos de Germano.

Os novos bares estão sem encanto. Os cardápios são apresentados virtualmente em QR-Code e a velha cerveja loura e estupidamente gelada está sendo substituída por drinks sem graça de sabores inventados pela mídia televisiva. Até os nomes, antes bem originais como os citados, agora exibem estrangeirismos como Adventure, Villa Food, Bistrô, Sunset e outras palavras estrangeiras que destoam da bela paisagem da avenida Litorânea.

Está escrito nas estrelas: o efeito Germano se perpetuará, ainda, por séculos, amém!

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