PESQUISA

Quase 10 mil crianças que vivem em abrigos tem até seis anos de idade

Esse é um dos resultados da pesquisa “Unidade de Acolhimento e Famílias Acolhedoras”, produzida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Esse é um dos resultados da pesquisa “Unidade de Acolhimento e Famílias Acolhedoras”, produzida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). (Foto: Divulgação)

Do contingente de aproximadamente 30 mil crianças em situação de acolhimento em abrigos ou em famílias acolhedoras no país, 33,8% possuem idade entre 0 e seis anos.

O dado revelador de que pouco mais de um terço está na primeira infância joga luz sobre esse tema sensível, explicitando a necessidade de políticas públicas e cuidados específicos direcionados a recém-nascidos, bebês e crianças pequenas em formação e desenvolvimento.

Esse é um dos resultados da pesquisa “Unidade de Acolhimento e Famílias Acolhedoras”, produzida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

O levantamento, divulgado em 29 de abril no Seminário do Pacto Nacional pela Primeira Infância, compõe – juntamente com outras quatro pesquisas – um amplo e inédito diagnóstico sobre o tema da primeira infância no Brasil.

Nos dados específicos sobre acolhimento, o levantamento verificou a situação em que esse serviço de assistência foi oferecido nos anos de 2019 e 2020 para o segmento da primeira infância, com o foco do estudo nas condições de infraestrutura e gestão dos serviços e perfil das crianças.

Uma das responsáveis pelo trabalho, Natália Barbieri explicou que as informações foram apuradas a partir de 100 análises feitas por uma equipe multidisciplinar a partir dos dados coletados.

A metodologia levou em conta as informações do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA) do CNJ, do Censo do Serviço Único de Assistência Social (Suas), de uma pesquisa de campo em 18 comarcas abrangendo 239 interlocutores e do mapeamento das legislações sobre o serviço de famílias acolhedoras nos estados e municípios.

Desse trabalho, resultou um amplo levantamento sobre as unidades de acolhimento da primeira infância. Por um lado, foram identificados pontos positivos como a ampliação das leis estaduais e municipais que tratam de famílias acolhedoras; a existência de unidades com capacidade de acolhimento superior à ocupação; e a construção do SNA como um sistema único para os dados do acolhimento infantil e adoção.

Foi, também, uma oportunidade para reunir dados sobre a incidência da Covid-19 pelo Censo Suas 2020.

Por outro lado, a pesquisa mostra vários desafios a serem enfrentados, entre os quais a infraestrutura limitada dos serviços em abrigos; força de trabalho insuficiente -especialmente de profissionais da área da saúde; e número baixo de famílias acolhedoras.

No detalhamento das informações qualitativas, a pesquisadora do Pnud Mônica Sillan contou que foi constatado que a negligência é o motivo mais recorrente para o acolhimento. “Essa categoria, negligência, já discutimos que é preciso dissecarmos esse conceito, que foi tão colocado por todas as categorias dos respondentes da pesquisa.”

Mônica informou ainda que as famílias de crianças acolhidas se ressentem de serem olhadas e tratadas como pouco capazes de cuidar dos filhos. Em outras informações, o levantamento em campo encontrou que  a maioria das famílias das crianças acolhidas não residem próximo à unidade de acolhimento.

Na rede socioassistencial, o número de unidades de acolhimento passou de 5.768, em 2019, para 6.276, em 2020. Das 508 novas unidades, 289 foram direcionadas a adultos ou famílias. Na rede de atendimento exclusivamente para crianças e adolescentes, o número de abrigos diminuiu de 2.801 par 2.798 no período analisado.

Sobre o perfil de profissionais que atuam no serviço a crianças com até cinco anos, a revela que, em 2020, 63,7% dessas pessoas tinham no máximo o ensino médio completo e 85% eram mulheres.

Em outro foco do serviço de assistência a crianças e adolescentes, o levantamento mostra que o total de famílias acolhedoras no Brasil registrou um leve aumento, passou de 381, em 2019, para 432 em 2020 – número ainda baixo e que indica a necessidade de avanço.  Nesse segmento, foi verificado que, em 2019, 42% abrigavam crianças entre 0 e 5 anos. Em 2020, o percentual ficou em 40,3% do total.

Na época de apuração das informações, pesquisadores e pesquisadoras verificaram que apenas cinco unidades da Federação contavam com legislação específica sobre o acolhimento familiar – Ceará, Tocantins, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Distrito Federal – e apenas 361 dos mais de 5,5 mil municípios em todo o país afirmaram ofertar esse tipo de serviço de assistência ao Censo Suas.

As informações mais recentes indicam que outros seis estados conseguiram avançar na legislação para a oferta desse tipo de serviço.

Sobre as reentradas no sistema de acolhimento, a pesquisa mostra que, em abrigos, o percentual de retorno passou de 30,9%, em 2019, para 31,5% no ano seguinte. No acolhimento familiar, nesse mesmo período, a reentrada passou de 22,1% para 21,4%.

Pandemia

Nas informações sobre a pandemia da Covid-19 nas unidades de acolhimento e entre os profissionais que atuam nesse serviço, a pesquisa mostra que, em relação à prevenção ao contágio do vírus, nos abrigos o serviço mais recorrente foi o aumento das ações de higiene e limpeza. Já nas famílias acolhedoras a medida mais utilizada foi o uso de celulares para garantir a comunicação remota das famílias durante o período de isolamento.

A partir do Censo Suas, constatou-se que a incidência da Covid-19 foi superior entre trabalhadores e trabalhadoras nas unidades de acolhimento, em comparação com a incidência do vírus na população maior de 18 anos, independentemente da região do país.

Ao apresentar os dados em um painel específico do Seminário Pacto pela Primeira Infância, Natália Barbieri disse que os maiores índices de contágio em trabalhadores e crianças das unidades de acolhimento em comparação à população de referência é um dos principais desafios em termos pode políticas públicas.

Outra dificuldade foi a falta de informações precisas sobre a cor e etnia das crianças no SNA, dificultando a compreensão do perfil étnico dos menores em abrigos e famílias acolhedoras.

Informações valiosas

A assessora de políticas públicas da Fundação Abrinq, Márcia Volpi, afirmou que as informações do levantamento são valiosas e necessárias para embasar políticas públicas para a primeira infância.

“Chama muito a atenção o risco de contágio de Covid-19 entre os trabalhadores (em abrigos e em famílias acolhedora) porque houve um debate na pandemia sobre a importância da vacinação dos trabalhadores do Suas como um grupo prioritário. E chama atenção também o número de municípios com o programa de família acolhedora e temos bastante espaço para expansão”, explicou.

No acolhimento familiar, a representante da Coalização pelo Acolhimento em Família Acolhedora, Cláudia Freitas Vidigal, destacou que esse é um programa de assistência que tem muito espaço para avançar. Segundo mostrou, enquanto no Brasil esse serviço representa apenas 7% do serviço de acolhimento, na Austrália, Reino Unido e EUA os percentuais são de 91%, 80% e 75%, respectivamente.

“Temos esse número pequenininho, de apenas 7% das crianças sendo acolhidas em famílias acolhedoras e apesar de pequeno estamos orgulhosos porque dois anos atrás era 4%. Então, estamos avançando, aumentando o acolhimento em famílias, mas podemos acelerar esse processo e eventos como esse vão nesse sentido porque sabemos a importância do sistema de justiça para que a implantação seja efetiva”, avaliou.

Segundo Cláudia Freitas, a meta é chegar em 2025 com 20% das crianças em acolhidas nessa modalidade. Participou do painel também a assessora do Ministério da Cidadania, Juliana Fernandes com a apresentação de informações sobre o Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária do governo federal.

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