CRIME

São registrados 98 casos de injúria racial em 80 dias no Maranhão

No ano passado foram registradas 405 ocorrências de injúria racial nas Delegacias de Polícia do Estado do Maranhão

Apenas sete estados possuem políticas em primeiro escalão voltadas para a temática. (Foto: Divulgação)

Atualmente a Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil da Ordem dos Advogados, secção Maranhão (CVENOABMA) apura e acompanha junto às autoridades do judiciário, 27 denúncias que envolvem racismo e injúria racial no estado, feitas do ano de 2020 até os dias atuais. A informação é do advogado Erik Moraes, presidente da CVENOABMA, da Comissão de Igualdade Racial da ABRACRIM-MA e vice-Presidente da Comissão de Igualdade Racial da ABRACRIM (Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas).

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Dessas, 7 denúncias de racismo e injúria racial foram registradas este ano e estão sendo acompanhadas pela CVENOABMA. Um dos casos ocorreu com uma recepcionista de uma academia da capital maranhense, que foi vítima de racismo praticado por mãe e filha. Segundo a recepcionista, “elas me chamaram de macaca, preta, cabelo ruim, sangue ruim. Eu nunca tinha passado por uma situação tão grave e que me abalasse. A gente ainda fica com muito medo, às vezes, de abrir uma bolsa em um local e ser perseguido em uma loja. A gente não tem paz, é a pior sensação que existe no mundo“, lamentou Tayná Coelho. “Sempre que a OAB-MA é acionada através da Comissão, essas vítimas têm os seus pedidos encaminhamos ao Comitê de Diversidade do Ministério Público do Maranhão e também à Polícia Civil, que é responsável por todo esse período de investigação, coleta de provas e indiciamento. Acompanhamos as vítimas de racismo durante a prestação de denúncias cobrando a solução e defendendo a causa negra”, garantiu o presidente da Comissão, Erik Moraes.

No dia Internacional Contra a Discriminação Racial, 21 de março, O Imparcial buscou saber como está o panorama dos crimes raciais no estado, e as políticas de combate ao racismo, um crime que segundo a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância e Conflitos Agrários, registrou 15 casos em 2020 e já este ano, 8 registros.

O crime de racismo é  definido no art. 20, caput, da Lei nº 7716/89, que diz “Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.

Comissão da Verdade

A Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil foi instaurada em 2019 pela OAB, com a competência de lutar pela promoção de Políticas Públicas, Igualdade Racial e a Reparação da Escravidão Negra no Brasil. Umas das principais diretrizes da Comissão é recuperar a verdade sobre o período da Escravidão, além de tirar da invisibilidade heróis e heroínas, combate ao racismo religioso e preservação e tombamento de locais sagrados e históricos ao povo negro. Também é uma luta da Comissão junto a órgãos públicos, a construção de Estátuas, monumentos de personagens negros(as) e o museus que contém a verdadeira história do Negro.

Segundo o presidente da Comissão, foi verificada durante a pandemia do novo coronavírus, um aumento significativo nas denúncias sobre as mais diversas formas de discriminação racial.

Assim, foi criada em parceria com a Comissão, a Defensoria Pública do Estado e a Defensoria Pública da União, o projeto Observatório de Cotas Raciais. “Trata- se de um site para o público em geral denunciar fraudes em cotas raciais no estado do Maranhão nos últimos 5 anos. Foi criado em razão das mais de 100 denúncias realizadas em redes sociais sobre o crime de Afroconveniência. Somente na UFMA são mais de 400 casos de fraudes sendo investigados”, disse Erik Moraes.

Dificuldade na coleta de provas

A Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância e Conflitos Agrários funciona desde setembro de 2018 no prédio da Secretaria de Estado da Igualdade Racial (Rua da Palma, 502, Desterro) e para o estado, foi um marco histórico, uma vez que o Maranhão é o segundo estado do Nordeste com maior número de afrodescendentes. Segundo dados do órgão, cujo titular é o delegado Agnaldo Timóteo Silva, em  2020 foram registradas 405 ocorrências de injúria racial nas Delegacias de Polícia do Estado do Maranhão. Em 2021, foram registradas 98 ocorrências desse crime. “Uma vez recebida a comunicação de crime, a Delegacia de Polícia realiza o imediato registro da ocorrência policial e um Inquérito Policial é aberto, seguindo-se na investigação até seu final. O objetivo central da investigação é identificar e indiciar o autor ou autores do crime, o que possibilita a abertura de processo judicial, que culmina com respectivo julgamento e apenação. No Estado do Maranhão, na pesquisa de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Maranhão, vê-se que várias pessoas já foram julgadas por práticas racistas”, informou o órgão.

Mas para investigar os crimes, a principal dificuldade está na coleta de provas. “Muitas vezes o crime é praticado sem testemunha presente. De qualquer forma, todos esses crimes, sejam os mais fáceis de apurar ou os mais difíceis, merecem completa investigação, inclusive em razão de sua gravidade, pois atingem valores e princípios fundamentais para todos os brasileiros, que são a igualdade entre todos e a dignidade da pessoa humana”, informou a Seir.

De acordo com Erik Moraes, a vítima de racismo deve sempre denunciar o fato e lutar pelos seus direitos de Igualdade e Liberdade. Vítimas ou pessoas que presenciam o crime de racismo ou qualquer outro tipo de crime de ódio podem registrar um boletim de ocorrência, ou ainda fazer a denúncia por meio do 190. “A partir daí, procurar a Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil na sede da OAB, Defensoria Pública do Estado, Defensoria Pública da União, Ministério Público e as Polícias Civil e Militar. Alertamos sempre as vítimas para manter a calma durante as agressões para que consiga realizar a colheita de provas e testemunhas, também através da filmagem de vídeos e áudios”.

Estatuto 
De acordo com a Secretaria de Estado da Igualdade Racial (Seir), o estado tem avançado nas ações em prol da população negra, povos e comunidades quilombolas e de matriz africana, com a criação de leis, decretos, programas, campanhas e  parcerias para a garantia de direitos e políticas públicas para esta população.

O Estatuto Estadual da Igualdade Racial,  sancionado em dezembro de 2020, é considerado um marco para estabelecer as diretrizes na defesa dos direitos humanos da população negra, efetivação da igualdade de oportunidades e combate à discriminação, ao racismo e às demais formas de intolerância étnico-racial.

“Uma das ações previstas no Estatuto Estadual da Igualdade Racial é a prorrogação das cotas para negros em concursos públicos da administração pública estadual até o ano 2030, destinando 20% das vagas oferecidas nos certames para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública estadual, autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista”, informou a Seir.

Combate ao racismo

Por causa da persistente incidência de práticas preconceituosas contra a população afrodescendente, o Tribunal de Justiça do Maranhão, por iniciativa do presidente desembargador Lourival Serejo, vem desenvolvendo uma campanha de combate ao racismo como fenômeno cultural, alertando para a necessidade de uma convivência respeitosa das raças e etnias em todas as esferas sociais. “A campanha tem como suporte constitucional e discurso afirmativo do texto da Carta Magna, que criminaliza as discriminações motivadas por etnia, religião ou procedência nacional, definindo como crime sujeito a pena de prisão o ato de recusar ou impedir acesso de pessoas negras – por motivo de raça ou cor – a estabelecimentos, bem como impedir ou criar obstáculo por qualquer meio ou forma o casamento ou convivência familiar ou social por motivo racial”, informou o TJ.

O Ministério Público do Maranhão destacou que atua em todas as comarcas do estado no combate à discriminação, à injúria racial e às práticas de racismo. As denúncias de práticas de racismo recebidas pela Ouvidoria e pelo Centro de Apoio Operacional de Direitos Humanos são encaminhadas às Promotorias de Justiça da comarca de origem do fato para averiguação e investigação. “O MPMA também acompanha os casos recebidos pela Delegacia de Crimes de Ódio. Em novembro de 2020, no Dia da Consciência Negra, foi criado o Núcleo de Promoção da Diversidade (Nudiv), ainda em fase de implementação, com o objetivo de propor estratégias, ações, metas e indicadores de melhoria e igualdade racial, voltados para o público interno e externo da instituição”, informou em nota a assessoria do órgão. A coordenação do Nudiv está a cargo a promotora de justiça Samira Mercês dos Santos.

A Defensoria Pública do Estado lembrou que durante a pandemia, foram realizadas discussões on-line para tratar do tema e sua problemática, como lives em redes sociais sobre racismo estrutural e webinários, dentre eles “Diálogo das pretas: resistência, identidade e vivências”, em homenagem ao Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha.

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