SÃO LUÍS

Veja a história do bairro do Desterro e seu comércio de pescado

Desterro, bairro famoso por sua forte comercialização de pescado, continua em pleno funcionamento, embora com a sua movimentação reduzida

Reprodução

O mercado de pescados resistiu à pandemia do Coronavírus, e está reagindo apesar da redução na oferta do produtos, em face ao período da entressafra que se inicia, causado pelos fortes ventos próprios do verão, que dificultam a captura dos pescados.

A reação também se deu na preservação dos empregos tendo os empresários reduzido seus quadros apenas quanto aos prestadores de serviço, mantendo os empregados contratados.

O entreposto do Desterro, bairro famoso por sua forte comercialização de pescado, continua em pleno funcionamento, embora com a sua movimentação reduzida, mas os empresários do setor acreditam no aquecimento do mercado com a reabertura dos bares e restaurantes, determinada pelo Poder Público.

A economia forte no Desterro

O bairro do Desterro é um dos mais antigos de São Luís e tem sua história marcada por uma economia forte, com um comércio pujante impulsionado pelas casas que trabalhavam com artigos manufaturados e exportavam para as cidades do interior, através da via marítima, ao mesmo tempo em que recebiam os produtos do setor primário que vinham nos barcos, lanchas que também rebocavam os batelões (embarcação geralmente construída somente com o que chamavam de casco e coberta de palha).

Era uma embarcação bem rudimentar destinada ao transporte somente de cargas. Não tinha motor nem velas e era dotada de apenas um leme que era operacionalizado por um tripulante. Ali vinham as amêndoas de coco babaçu, paneiros de farinha, sacos de arroz com casca, suínos, caprinos, ovinos e outros animais para o abate, cachaça da terra produzida na Baixada Maranhense, e outros, enquanto as lanchas, propriamente ditas, transportavam passageiros e suas bagagens, e menor quantidade de mercadorias.

Tudo isso proporcionava uma grande movimentação, desde as madrugadas, na extinta Praia do Desterro, onde existiam casas comerciais fortes como a quitanda de Seu Zé Reis especializada na venda de material pra construção naval, como breu, estopa para calafetagem, tintas, lubrificantes e ferragens. Os comerciantes Camarão e seu sócio Calé, que trabalhavam mais com produtos manufaturados.

Peixe vivo da Baixada

Enquanto que no comércio de Amadeu Pinto, tudo era encontrado, pois ali vendia uma variedade grande de mercadorias, que ia desde as cocadas, bolos e os calções confeccionados por Dona Davina, sua esposa, inclusive perfume no varejo, medido em um pequenino cálice, muito procurado pelos embarcadiços que depois de um dia de trabalho pesado, procuravam diversão na zona do baixo meretrício, notadamente nos lupanares conhecidos como Espoca e Mata Homem, localizados na Rua Afonso Pena.

Amadeu Pinto trabalhava também com abate de suínos, fabricação de banha de porco que vendia para os hotéis e restaurantes e era o único a vender peixe da àgua doce vivo. Ele recebia da Baixada Maranhense, barricas cheias d’água com jeju e traíra vivos e os vendia em dúzias para os amantes destes pescados sempre muitos presentes na mesa dos “baixadeiros”.

Tradição com os pescados

Desde aquele tempo, o Desterro é o principal entreposto de pescados da capital. As embarcações de porte médio, que mesmo sendo a velas, desenvolviam alta velocidade, era chamadas de “geleiras”, visto serem utilizadas para o transporte de pescados vindos dos municípios do litoral, como Guimarães, Cedral, Cururupu, Bacurituba, Porto Rico e outros muitos ricos, até hoje, em peixes de agua salgada, usando o gelo em barra para a conservação dos produtos.

As geleiras tinham como ponto de desembarque de pescados e embarque de barras de gelo que utilizavam para a conservação do pescado trazidos para a capital, a área denominada Portinho, que tinha um igarapé que possibilitava a entrada de embarcações até bem próximo do Mercado. A Praia do Desterro e o igarapé do Portinho foram soterrados com o advento do aterro do Bacanga. Ali, na área que era conhecida como Dique, havia uma colônia de pescadores que descarregavam os pescados capturados nas baias da capital, e se alojavam em uma cabana apenas coberta de palha, onde se dedicavam ao conserto dos seus apetrechos de pesca e descansavam até chegar a hora de voltar para o mar.

Um bairro industrial

O Desterro dos anos 50 e parte dos anos 60 era também industrial, com suas fábricas de pilar arroz, da empresa Chames & Aboud; de extração de óleo de coco babaçu, do empresário Lázaro Ducanges; Serraria dos Irmãos Lobato, que beneficiava madeiras; Fábrica de sabão da Oleama, na Rua da Estrela; fábrica do Guaraná São Jorge, da empresa M.Feres & Companhia, capitaneada pelo empresário Jorge Feres, na Rua Afonso Pena, esquina da Rua Jacinto Maia, que depois virou uma torrefação de café.

Havia também na Rua Afonso Pena, as metalúrgicas que fabricavam peças de serralheria e ferragens para embarcações, e tornearia mecânica que fabricava peças de reposição para veículos e motores marítimos, destacando-se a oficina de seu Mundico Carvalho, que residia numa casa morada inteira conhecida como Solar dos Carvalho, em frente ao Mata Homem, na Rua Afonso Pena.

Geleira desapareceram

As embarcações geleiras hoje tem sua função reduzida. Apenas transportam os pescados capturados em alto-mar ou na região das praias, para as cidades. Dali os produtos são trazidos para São Luís ou levados para outros centros, em caminhões frigoríficos, conforme informou o empresário Jesiel Quadros, que a décadas se dedica ao comércio de pescados.

Ele disse que a logística do transporte de pescados teve que mudar, visto que por ser um produto altamente perecível, tinha que chegar logo ao destino, ou seja, ao entreposto e dali para o consumidor. Jesiel, no entanto, reclama das condições oferecidas aos veículos que transportam pescados para a capital e denuncia que os caminhões ficam muitas horas esperando para serem aceitos nos ferry-boats, que com as viagens reduzidas por determinação do poder público, teve sua demanda aumentada. Ele defende que as cargas de produtos perecíveis deveriam ter prioridade.

O empresário Jesiel também manifestou sua insatisfação com a situação precária do entreposto de pescados do Desterro, situado atrás do Mercado do Peixe, tomado pela lama e com péssimas condições de higiene e alto índice de insalubridade, esquecido pesar da sua importância para a vida da cidade, sendo força motriz da economia, fazendo circular riquezas e oferecendo centenas de empregos diretos e indiretos, quando se vê obras sendo desenvolvidas no entorno e que não irão gerar renda para o Município ou Estado. “Se aqui fosse realizada uma obra que desse melhores condições e dignidade, com certeza, todos que aqui trabalham com venda de pescados, se tornariam permissionários e pagariam taxas para a Administração Pública, apesar de já contribuir com o erário, pagando os impostos.

Mercado em ascensão

A movimentação das vendas de pescados no Desterro, sofreu com a pandemia, uma redução em média de 50%, conforme avalia a empresária Maria José Lima, dona de peixaria. Ela disse que na fase mais aguda da pandemia, o mercado sofreu grande retração com suas vendas em queda, obrigando também a redução do trabalho de modo geral, visto que a procura sofreu grande queda com o fechamento de restaurantes e dos açougues em feiras e mercados, já que grande número de revendedores, temendo a contaminação pelo Coronavírus, suspenderam suas atividades.

O empresário Ermilton Ferreira, avalia que o mercado de pescados está enfrentando sérios problemas neste momento, visto que, quando se registra uma redução na incidência da Covid-19, entre o período da entressafra dos pescados, em virtude dos fortes ventos próprios do verão, que prejudicam a captura dos peixes.

Além disso, há concorrência desleal por parte dos supermercados que chegam a vender o pescado sem margem de lucro, visto acreditarem que sua comercialização impulsionam as vendas de outros produtos, oferecendo outros ganhos, já que oferecem facilidades de pagamento pelos cartões de crédito. “Esta conduta prejudica o pequeno revendedor das feiras e mercados, que deixam de vender seus peixes”, avalia Ermilton. Ele disse que, apesar dos problemas causados pela pandemia do Coronavírus, não dispensou seus funcionários contratados.

Wilson Silva Cutrim, atacadista do comércio de pescados, também avaliou que a pandemia causou sérios danos no mercado, com grande reflexo nas vendas, mas observa que o mercado está reagindo, graças ao trabalho continuo de enfrentamento dos problemas por todos os segmentos.

Com 55 anos de atividades na Rua Afonso Pena, o empresário Moisés Bernardo dos Santos se viu obrigado a parar por algum tempo, mas manteve os seus empregados. Explicou o gerente Jacksandro Viégas Coutinho, que a empresa enfrentou sérios problemas com a paralisação temporária de suas atividades, mas honrou seus compromissos com os empregados, mantendo-os no empregos e pagando parte dos seus salários, conforme preceitos emanados do Governo Federal. “Infelizmente tivemos que dispensar os prestadores de serviços, visto que sua manutenção iria onerar muito a nossa folha e não tínhamos como suportar”, disse.

Infelizmente tivemos que dispensar os prestadores de serviços, visto que sua manutenção iria onerar muito a nossa folha e não tínhamos como suportar

Ele também se manifestou otimista com o anúncio da reabertura dos restaurantes e bares, apesar de alguns terem aberto falência, mas que o mercado está reagindo e que acredita que em breve, tudo irá voltando ao normal, mesmo que paulatinamente.

VER COMENTÁRIOS
Polícia
Concursos e Emprego
Esportes
Entretenimento e Cultura
Saúde
Mais Notícias