MARANHÃO

Famílias quilombolas de Alcântara sofrem ameaça de perda de território

Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro pretende expandir o território da Base Espacial em 12 mil hectares

Reprodução

Cerca de 800 famílias de 30 comunidades quilombolas, que residem no município de Alcântara, no Maranhão, sofrem ameaça de remoção de sua terra por parte do governo federal.

O Diário Oficial da União, trouxe na edição do último dia (27), a Resolução 11/2020, publicada pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que estabelece diretrizes para a expulsão e reassentamento devido ao Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro.

A comunidade, apesar de ocupar há mais de três séculos o território, tem sua permanência ameaçada desde a assinatura do Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST).

O documento trata, entre outros assuntos, sobre a prorrogação de prazos de Grupos de Trabalhos (GT’s), aprovação de relatórios e diretrizes sobre a orientação ou plano de consulta às famílias quilombolas.

Nele foi aprovado também plano de comunicação voltado para as comunidades e explicado as ações que cada ministério deve fazer, frente, segundo o documento, “às políticas públicas destinadas às comunidades que habitam a área de interesse do Estado na consolidação do Centro Espacial de Alcântara”.

A resolução assinada pelo General Augusto Heleno, ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), também prevê que a base espacial avançará cerca de 12 mil hectares além da área já utilizada pelo Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), o que na prática remove de seu habitat, precisamente 792 famílias, segundo levantamento feito pelo Movimento por Atingidos pela Base Espacial (MABE).

INTERESSES

Segundo o assessor jurídico das comunidades e integrante do Movimento dos Atingidos pela Base Especial de Alcântara (Mabe) e da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Danilo Serejo, a região é a mais estratégica em termos de soberania alimentar por ser o litoral do município.

“Essas comunidades saindo da região e ficando sob controle dos Estados Unidos, nós vamos instalar um quadro grave de insegurança alimentar, além de dar como certa uma remoção que na prática deveria ser precedida de consulta prévia como dispõe a convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) da qual o Brasil é signatário”, advertiu. 

Ao todo, 8 ministérios: Defesa; Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Educação; Cidadania, Saúde, Minas e Energia; Ciência, Tecnologia e Inovação e Turismo, possuem já definidas, suas atribuições num futuro remanejamento das famílias. Como exemplo, ao Ministério da Defesa coube, o trabalho de execução da mudança e ao Incra, órgão vinculado ao Ministério da Agricultura, a missão de reassentá-las.

Já o Ministério do Turismo, deverá promover, de acordo com a resolução, por meio do Institutos Palmares e do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), a “recomposição de áreas e instalações compatíveis com as existentes nos espaços hoje habitados pelos quilombolas, para a prática de atos religiosos”.

Para o descendente de comunidades tradicionais de matriz africana, ativista afro religioso e especialista em gestão do patrimônio cultural e imaterial Neto de Azile, a realização de tamanha atrocidade e violência, provocará a destruição do sentido de pertencimento e identidade com consequências destrutivas nas dimensões culturais, religiosas e biológicas, sem precedentes.

“É de fato o extermínio dessas populações, onde não mais coexiste a divisão entre território e suas tradições. O território é sacralizado por um sacerdote ou sacerdotisa onde se recria a ancestralidade africana no mundo ocidental. O que acontece, neste caso, é um etnocídio concorrendo também para o genocídio dessas comunidades. Nenhum engenheiro poderá determinar que esse ou aquele lugar poderá substituir algo que é sagrado”, finalizou. 

Para o secretário de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular (SEDIHPOP), Francisco Gonçalves, a decisão foi apressada e não levou em consideração nem o término dos trabalhos do grupo designado para fazer os estudos necessários que o caso requer. Por isso, a Sedihpop solicitou, em nota, além da anulação da resolução, que sejam disponibilizados, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), o envio da íntegra de documentos de interesse público citados na resolução 11/2020 do Comitê.

“A Sedihpop enviou Nota Técnica diretamente ao General Augusto Heleno, à Delegacia de Patrimônio da União (DPU), ao Ministério Público Federal (MPF), para conselhos, organismos e comissões ligadas aos Direitos Humanos, onde explicamos ponto a ponto as razões pelas quais a resolução precisa ser sumariamente anulada. Nem mesmo o fato de estarmos vivendo um momento de pandemia por conta do alastramento do Coronavírus foi levado em consideração por parte do Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro”, explicou Francisco Gonçalves.

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