Juçara, o fruto que vira ouro no Maracanã
A produção da juçara no bairro é uma verdadeira forma de expressão cultural, mantida e repassada de geração em geração
A importância da juçara para o Maracanã, bairro localizado na zona rural de São Luís, vai muito além dos milhares de litros da polpa vendidos anualmente pelos moradores, especialmente na festa realizada tradicionalmente há quase 50 anos. Sua produção é uma verdadeira forma de expressão cultural, mantida e repassada de geração em geração, ao longo das décadas.
“Essa região aqui sempre foi cheia de juçara e antes mesmo de existir a festa a gente já ‘fazia’ juçara em casa, pra consumo próprio. Comprava dessas latas de querosene cheia da fruta e passava a tarde amassando”, lembra Maria de Jesus Assis Marques, a Dona Cotinha, de 77 anos. Ela é uma das mais antigas moradoras da região e durante muitos anos foi presidente da Associação dos Amigos do Parque da Juçara. Foi ela, em parceria com outros produtores, que deu continuidade à Festa da Juçara, após a morte de sua idealizadora, a ambientalista Rosa Mochel.
“A Dra. Rosa morava aqui e viajava muito pelo país. Ela dizia que todo estado tinha uma festa e achou que nossa juçara merecia uma também. Ela saiu de casa em casa chamando as pessoas para formar uma comissão. Éramos 12 nesse grupo e fomos indo até levantar a festa”, conta dona Cotinha.
No começo as poucas barracas eram de pau a pique, cobertas de palha. As famílias se reuniam para produzir a juçara, em um processo artesanal. Apenas 20 anos depois do início da festa foi que surgiu o parque, que ganhou barracas de alvenaria em 2003.
“Antes da vigilância sanitária exigir o processamento da juçara em máquinas [despolpadeira], a gente amassava mesmo era com a mão. Eu tinha seis amassadeiras comigo naquela época e enquanto a gente amassava, ia cantando e conversando. Passava o dia todo nisso e era muito divertido. Era amassando e vendendo no litros, com a palha da juçara como rolha. Hoje não, só precisa de duas pessoas pra processar e num instante é feito”, conta a ex-presidente, que aprendeu com a mãe o processo.
“Minha mãe dizia que a juçara é uma planta soberana, era só olhar que a gente via o quanto é alta. Por isso também que devia ser a última refeição, não se comia nada depois dela”, diz dona Cotinha.
“Amassa juçara que eu quero ver
Botar na peneira pra gente beber.”
OUTRAS HISTÓRIAS
Francisco Schwerz nasceu no mesmo ano em que foi criada a Festa da Juçara. Aos 49 anos, ele conta que cresceu entre as barracas, acompanhando a mãe que trabalhava como amassadeira. Só depois que o pai, artesão, passou a levar sua arte para o local.
“Era muito animado aqui, sabe? A gente amassava no pilão ou no alguidar [vasilha de barro] com o litro e eram muita gente, aí espirrava juçara na nossa roupa e a gente passava a mão suja no rosto dos outros, de brincadeira. Era muito divertido”, lembra Francisco.
Naquela época a polpa era vendida natural e o cliente levava o produto produzido na hora, hoje ela mantida refrigerada antes do consumo.
Francisco também aprendeu que a juçara deve ser a última refeição do dia e que ela não precisa de muitas misturas para ser degustada. “Você sabia que nem água a gente deve beber depois de tomar a juçara? Precisa esperar um tempo, porque se não, você vai ficar com muita sede. Não sei te dizer o motivo, só sei que é verdade!”, alerta o ludovicense, nascido e criado entre os grãos de cor violeta-escuro.
FESTA DA JUÇARA
A Festa da Juçara acontece até dia 04 de novembro, no Parque da Juçara, que fica aberto todos os dias, das 8h às 23h, e tem entrada gratuita.