Saldo macabro

BR-135: rastros de acidentes e mortes

Duplicação da BR-135 já dura quatro anos e os atrasos comprometem a vida na única via de acesso terrestre à capital do Maranhão

Reprodução

A Rodovia Federal BR-135, que liga o meio norte do Brasil, começando no Maranhão, passando pelo Piauí e Bahia, e terminando em Minas Gerais, é uma das mais importantes rotas de escoamento de produção da região, sendo ainda a única saída por terra da Ilha de São Luís. É também uma das rodovias mais perigosas do país.
São mais de 2.500 km, dos quais 26,5 km precisam com urgência de duplicação. Um pedido antigo da população maranhense, cujo suplício aumenta em dias como no último domingo (3), quando um acidente envolvendo um carro de passeio e um caminhão resultou em oito mortos, de quatro famílias diferentes, agora enlutadas com todo o estado.
Mais um mês, mais um luto
Estavam no táxi-lotação: Helena Santos da Conceição, de 70 anos, sua filha Valdicleide Santos da Conceição, de 34 anos, Kelvin Daniel Costa, de um ano e quatro meses, neto de Helena; Reginaldo ‘Careca’, motorista, sua esposa Vanda e a filha Hana, de oito anos; Dionísio Silva, pedreiro de 28 anos; e a estudante Rosânia Santos, de 14 anos. O carro, modelo Corsa Classic, colidiu com um caminhão que transportava lixo. O município de Humberto de Campos, de onde a maioria das vítimas era, decretou luto oficial em respeito à memória das famílias.
O grande fluxo de veículos na rodovia, que tem apenas uma pista, se agrava pela quantidade de buracos. São mais de 200 apenas no trecho que cobre o km 0, na rotatória do Aeroporto Cunha Machado, e o km 23, na Estiva, segundo levantamento exclusivo feito por O Imparcial em março deste ano.
Desviar desses buracos tem sido, além de um transtorno e causa de prejuízos materiais, a razão de perda de muitas vidas. Como a da bailarina Ana Lúcia Duarte, de 52 anos, vítima de latrocínio após ter de diminuir a velocidade do carro para desviar dos buracos e elevações na pista, na madrugada do dia 27 de março.
No mesmo mês, ainda na primeira semana, um acidente deixou cinco pessoas gravemente feridas, na altura do km 34, no Campo de Perizes. Na colisão, um dos veículos partiu ao meio. Dois meses depois, uma viatura da polícia militar capotou no Km 18, deixando um dos policiais com ferimentos.
Ainda no mês de março, um motociclista morreu no Km 115, em Miranda, e uma idosa teve o corpo esmagado em uma colisão transversal entre uma moto e um caminhão. Em maio, uma colisão frontal resultou na morte de duas pessoas e oito feridos, no Campo de Perizes.
Entre setembro e outubro de 2015, entre os acidentes registrados, uma carreta que transportava farinha tombou no Km 17, e um rebanho de búfalos foi atingido por um veículo com dois ocupantes, sublinhando apenas mais um dos problemas na rodovia: animais soltos em vários trechos da rodovia.
Sucessivas paralisações
A tão sonhada duplicação da rodovia, de responsabilidade do Governo Federal, sob competência do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit-MA), teve sua primeira previsão de início ainda em agosto de 2011, mas foi adiada sucessivas vezes até finalmente ser iniciada em setembro de 2012.
A previsão, à época do início das obras, era que se realizassem três etapas: lote I, da Estiva ao município de Bacabeira, com um investimento de R$ 354 milhões, compreendendo 27km e considerado pelo próprio Dnit como “o mais urgente por causa do alto índice de acidentes ali registrado”; o lote II, de Bacabeira ao povoado Outeiro (entroncamento de Itapecuru-mirim), com 44km, e com investimento de R$ 107 milhões; o lote II, de Outeiro até Miranda do Norte, com um orçamento de R$ 63 milhões e 31km.
De lá para cá, já são quatro anos de paralisações, com causas atribuídas ao clima local ou à falta de recursos. Em 2013, em uma publicação hoje apagada do site da autarquia, o Dnit declarava ter gasto mais de R$ 1 bilhão em execuções de obras no país, e que elas estavam em “bom ritmo”. Na mais recente publicação, o órgão afirma que a “duplicação começou em setembro de 2012 e sofreu alguns ajustes no cronograma de conclusão motivados, principalmente, pelos intensos períodos de chuva que todos os anos atingem a região e pela execução dos serviços de alta complexidade realizado no Campo de Perizes (colunas de brita)”.
Para o Dnit os atrasos tem explicação e fazem parte do processo. O órgão afirma que as obras “não foram paralisadas”, mas que houve atraso nos serviços, devido à “disponibilidade de orçamento financeiro do Governo Federal em 2015”. Em nota, a Assessoria de Comunicação do Dnit afirma que o prazo de entrega é até abril de 2017.
O papel do Governo do Estado
Cobrado pela população em tomar uma atitude, o Governo do Estado aponta que sua responsabilidade está com as rodovias estaduais, as MAs, e em nota sobre a mais recente tragédia classificou a obra como estando em um “ritmo absurdamente lento” e de “inexplicável paralisação”. Na mesma nota, o governo estadual disse estar “tomando providências junto à bancada federal do Maranhão e ao Ministério Público Federal, a quem compete fiscalizar omissões administrativas no âmbito federal”.
Em abril, as obras foram retomadas, mas se concentrando apenas na construção de um viaduto de acesso à cidade de Rosário, no entroncamento da BR-135 com a BR-402. A duplicação da BR-135 está prevista no Plano de Aceleração do Crescimento do Governo Federal. Segundo o Dnit, apenas esse trecho tem um investimento de mais de R$ 484 milhões.
O governador Flávio Dino, em sua conta do Twitter, falou sobre o assunto e garantiu que devem ser tomadas providências do Governo Federal em relação à obra.
“Falei agora com o ministro dos Transportes, Maurício Quintella. Ele me disse que a empresa garantiu intensificar obras na BR-135 nesta semana. Empresa garantiu ao Ministério que terá 116 funcionários e 65 equipamentos na obra, em três frentes de trabalho. O Governo do Maranhão manterá a cobrança e o acompanhamento sobre a estrada federal, como temos feito há mais de um ano”.
Flávio Dino se reuniu com o líder da bancada federal, Juscelino Filho, a fim de solicitar uma maior pressão no Governo para aceleração nas obras da rodovia.
Deputados repercutem acidente na BR-135
Por João Carvalho Jr.
O principal assunto na primeira sessão ordinária da semana na Assembleia Legislativa do Maranhão foi o acidente da BR-135, que vitimou oito pessoas.
O primeiro a falar sobre o tema foi o deputado César Pires (PEN), que viu de perto o ocorrido. O parlamentar declarou que não quer que nenhum colega veja o que ele presenciou. “Que meus olhos não vejam mais o que estava ali. Não quero que nenhum de vocês veja também. Aquilo [acidente] é resultado da falta de maior comprometimento nosso. Até quando vamos ficar aqui, sem reagir?”, disse César Pires, com claros sinais de revolta.
O deputado Cabo Campos (DEM), visivelmente emocionado, leu uma nota de um jornalista, que conhecia as vítimas do acidente. Raimundo Cutrim (PCdoB) propôs o envio de um documento cobrando responsabilidades do Ministério dos Transportes. Bira do Pindaré (PSB) uniu forças com os colegas e disse que é inadmissível que mais vidas sejam perdidas na “Estrada da Morte”.
Júnior Verde (PRB) pediu ao presidente da Casa, deputado Humberto Coutinho (PDT), que ele tome a iniciativa de marcar audiência junto ao ministro dos Transportes e ao diretor-geral do Dnit. Já Eduardo Braide (PMN) levantou a sugestão de mudar a execução da obra de duplicação das obras. “Que essa obra de duplicação seja entregue ao Exército Brasileiro. Ele já vem fazendo a estrada da MA-034. A ligação entre Natal à João Pessoa, pela BR-101, foi feita pelo Exército. Que o mesmo seja feito aqui”, indicou Braide.
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