CIDADE OLÍMPICA

Mesmo batizado com nome do evento, bairro vive longe do espírito olímpico

Localidade enfrenta problemas de infraestrutura, segurança, acesso à educação e saúde, e por isso, se mantém indiferente aos Jogos Rio-2016

Uma das maiores áreas de ocupação da América Latina, o bairro da Cidade Olímpica, em São Luís, foi criado entre os anos de 1996 e 1997. A região de mais de 1.400 hectares, que hoje abriga cerca de 31.000 habitantes, foi batizada em homenagem aos Jogos Olímpicos de 1996, realizados em Atlanta, nos Estados Unidos. Nos últimos 20 anos, no entanto, o espírito olímpico parece estar longe dali, e a referência festiva deu lugar a um bairro associado à violência urbana e a uma infraestrutura bastante vulnerável.
Logo de início, uma surpresa: mesmo sendo uma “cidade olímpica”, não há sequer uma praça pública ou instalação esportiva no local. Segundo a microempresária Maria de Jesus Cardoso, a alusão às Olimpíadas não prosperou. “Não tem uma praça, um parque, nada de diversão. É Cidade Olímpica, mas não tem nada que represente as Olimpíadas. Ninguém pode ser atleta aqui. Não tem vias para atletismo, praça para as crianças, aqueles aparelhos que a gente vê na Lagoa da Jansen… é só o nome mesmo, coincidência”, desabafa.
Maria de Jesus e Cristiano Marques dono de Marcenaria na Cidade Olímpica

De acordo com a moradora, que é sócia de uma marcenaria com o esposo, um dos piores problemas do bairro é o transporte público. “Esse negócio de ônibus é a pior coisa que tem. Você vai para uma parada e perde muito tempo. Se você sai daqui para o São Francisco, por exemplo, você gasta mais de duas horas de viagem. Isso, se você não pegar muito engarrafamento. E tudo isso atrapalha a vida das pessoas. A gente só anda de ônibus porque é necessário. E, além disso, os ônibus são como são. Se você estiver dentro do ônibus e estiver chovendo, você tem que abrir o guarda-chuva, senão você vai se molhar de qualquer forma. A passagem é cara, a gente paga R$ 2,90 para isso”.

Na Associação de Moradores do bairro, é consenso: a falta de opções de lazer influencia negativamente a vida da população. “Lazer aqui é igreja, academia ou bar. Bar, já sabe como é. Para levar criança, para passear, lazer não tem… Aí muitos deles terminam se envolvendo com coisa errada”, afirma o Irmão Cutrim, coordenador de logística e transporte da associação. Se, por um lado, o esporte e lazer não fazem parte do dia-a-dia da Cidade Olímpica, alguns pontos negativos chamam atenção no bairro.
Irmão Cutrim, coordenador de Logística e Transporte da Associação de Moradores do bairro da Cidade Olímpica

“Nós não temos nenhum banco, só um caixa eletrônico 24h. Faculdade, não tem. Nem pública, nem particular. Não temos um hospital, maternidade… aqui só é pronto-atendimento de segunda a sexta-feira. Se você precisar de noite, domingo, você tem que sair da Cidade Olímpica”, confessa Cutrim.

A pavimentação asfáltica na região está em péssimas condições. Mesmo nas avenidas principais, a quantidade de buracos no asfalto impressiona. Isso, diz o coordenador, afeta diretamente o serviço de transportes do bairro, e também ameaça a vida dos moradores. “Eu sei que os outros bairros também estão ruins, mas se disser que a pavimentação está péssima, é porque não conhece a Cidade Olímpica. No começo desse mês morreu um motoqueiro porque quebrou o pescoço quando caiu num buraco”, declara.
Acesso à educação
Outro problema apontado pelos moradores é o difícil acesso à educação. No total, o bairro dispõe de apenas seis escolas: três de Educação Infantil, duas de Ensino Fundamental e uma de Ensino Médio, o que é insuficiente para atender a totalidade da população da região. Não há nenhuma Instituição de Educação Superior, pública ou privada. Para a associação de moradores, isso afeta a taxa de evasão escolar entre os jovens da área. Apenas 28,3% dos jovens entre 18 e 20 anos terminaram o Ensino Médio, segundo pesquisa do Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil.
Entre as pessoas com 18 anos ou mais, 31,96% acumulam dois pontos preocupantes: não completaram o ensino fundamental e mantém ocupação informal, o que mantém um alto índice de vulnerabilidade social na região. Das 126 regiões ludovicenses pesquisadas pelo Atlas Brasil, a Cidade Olímpica ocupa a posição 103 no ranking de renda, com um valor de R$ 352,04 na renda per capita. Somado a um desemprego de 10% e aos 89,93% de famílias que vivem com no máximo dois salários mínimos, o bairro é um dos mais pobres da capital.
Segurança e Educação
Iran Serpa Duarte é recepcionista e vive na Cidade Olímpica desde o surgimento da ocupação. Retomando um pouco da história do bairro, comenta o difícil processo enfrentado pelos primeiros moradores. “Eu tô aqui desde o início. O que mudou foi que quando nós entramos aqui, era tudo mata virgem. Dia 29 de dezembro de 1996. Tivemos duas ocupações. A primeira foi feita em julho, mas essa ocupação não vingou. Passamos dois meses longe daqui, aí a equipe se reuniu e fizemos uma ocupação organizada. Tinham cercado a área, colocaram cavalaria, mas, quando deu dia 29 de dezembro, entramos aqui… e não saímos mais”. Apesar da batalha travada para o reconhecimento do bairro, as mudanças na região foram poucas. Para Alberto Mendonça, mestre de obras, que vive há 18 anos na Cidade Olímpica, a crescente insegurança é um dos principais problemas de quem vive ali. “Olha, pra mim que vivo aqui desde o começo, realmente digo que é perigoso. Tem muitos locais, muitas ruas aqui, que nem eu tenho coragem de entrar. De um certo tempo pra cá, ficou pior ainda. Você fica com medo de sair e chegar depois de meio-dia, uma da tarde. Tem muitas ruas, que se você entrar, tem até que pagar uma taxa. Passando da Avenida dois, você não pode nem entrar. Há uns dois fins de semana, foram sete mortes em dois dias”, afirma.
Na região, segundo a associação dos moradores, três facções disputam o controle: o Bonde dos Quarenta, o Primeiro Comando da Capital e o COM, Comando Organizado do Maranhão, subdivisão que nasceu do PCM. Paula Cleidiane, secretária, diz que o principal medo são as disputas internas entre os bandos. “Quando se encontram, começa a rivalidade entre eles e a gente fica apreensivo, sem poder fazer nada”, comenta.
Saiba Mais
Área total: 1436 hectares (equivalente a cerca de 2000 campos de futebol)
População: 31.294 (48,54% Homens, 51,46% Mulheres)
IDH da região: 0,670 (médio)
Renda per capita: R$ 352,04
Desemprego: 10,03%
Percentual da população com rendimento de até dois (2) salários mínimos: 89,93%
Número de pessoas com ensino superior completo: 1,4%
Escolas: 6 (Educação infantil: 3, Ensino fundamental: 2, Ensino Médio: 1)
Postos de saúde: 3
Hospitais: 0
Universidades: 0
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