ARTIGO
Licenciamento transparente no trato dos temas socioambientais
As discussões sobre a regulamentação do processo de licenciamento ambiental e da definição dos estudos ambientais prévios não é recente. Há muito se fala na necessidade de revisão das normas federais, e há mais de uma dezena de projetos de lei apresentados no Congresso Nacional ao longo da última década. A discussão pública sobre o […]
As discussões sobre a regulamentação do processo de licenciamento ambiental e da definição dos estudos ambientais prévios não é recente. Há muito se fala na necessidade de revisão das normas federais, e há mais de uma dezena de projetos de lei apresentados no Congresso Nacional ao longo da última década. A discussão pública sobre o licenciamento tem sido dominada pela ideia de agilidade, como se o processo não envolvesse a necessidade de buscar a conciliação entre atividades econômicas e questões ambientais e sociais concretas.
A tentativa de retirar do licenciamento os conteúdos que constituem sua razão de existir tem sido, na prática, uma das origens para os conflitos que o envolvem (abrangência, tempo, qualidade de consultas públicas e dos estudos ambientais etc.). Ao contrário de um foco cartorial em agilidade, o que precisa ser feito é qualificar o processo e as instituições para que o licenciamento consiga dar respostas adequadas à diversidade de situações, desde obras de grande impacto até os pequenos empreendimentos autorizados nos municípios. Regras, critérios e procedimentos técnicos e capacidades das instituições precisam guardar proporcionalidade com as diferentes características do que está sendo licenciado.
Por paradoxal que possa parecer, grande parte do que precisa ser feito para o aprimoramento do licenciamento (para lhe dar sentido, previsibilidade e transparência) está fora dele. A operação do licenciamento necessita de referências e diretrizes estratégicas tanto de um melhor planejamento de setores, como energia e transporte, quanto do desenvolvimento e utilização de instrumentos de planejamento pelas instituições ambientais. A ausência de consideração dos temas socioambientais em níveis estratégicos tem limitado sua incorporação na vida econômica e social do país e sobrecarregado o licenciamento (que opera no nível de projetos) com questões e conflitos para os quais ele não tem capacidade de resposta.
O tratamento deste tema é um dos aspectos positivos de vários dos projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional. Esse é o caso do substitutivo apresentado recentemente pelo deputado Ricardo Tripoli. Ele estabelece a obrigatoriedade da incorporação dos temas socioambientais no planejamento de diversos setores por meio da realização de Avaliações Ambientais Estratégicas (AAE). O substitutivo também propõe a utilização de Zoneamentos Ambientais pelos órgãos licenciadores como base para a identificação da significância dos impactos ambientais potenciais dos empreendimentos. Isso deverá trazer maior clareza para a definição do tipo de estudo ambiental exigido e sobre o conteúdo destes estudos, melhor gestão da informação produzida, menor discricionariedade e maior transparência da tomada de decisão.
É preciso mencionar que há também aspectos menos positivos nos diversos projetos de lei. Temas importantes e garantias são negligenciados em favor da ideia de agilidade e são criadas exceções que parecem desconstituir o melhor das propostas de aprimoramento. É fundamental que o processo de debate sobre as propostas de regulamentação seja o mais aberto e amplo possível e que envolva a diversidade de atores sociais interessados. Uma das iniciativas importantes para a discussão pública sobre a prática do licenciamento e as propostas de regulamentação é o seminário promovido pelo Ministério Público Federal e o Instituto Socioambiental (ISA), em 5 de novembro próximo, Licenciamento Ambiental: realidade e perspectivas. Nele, participarão especialistas, gestores públicos e lideranças políticas diretamente envolvidos com temas como participação e acesso à informação, planejamento, judicialização e direitos dos povos tradicionais.
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