EDITORIAL
A China e o Brasil
O caos demográfico ameaça a China mais uma vez. Em 1979, o país pobre, com recursos limitados, precisava conter o crescimento populacional. Além de alimentar, tinha de vestir, abrigar e educar 1,3 bilhão de pessoas. Impôs, então, um dos mais ambiciosos experimentos na história humana — o limite de um filho por família. Den Xiaoping, […]
O caos demográfico ameaça a China mais uma vez. Em 1979, o país pobre, com recursos limitados, precisava conter o crescimento populacional. Além de alimentar, tinha de vestir, abrigar e educar 1,3 bilhão de pessoas. Impôs, então, um dos mais ambiciosos experimentos na história humana — o limite de um filho por família.
Den Xiaoping, o pragmático sucessor de Mao Tsé-tung, conduziu com mão de ferro a aplicação da medida. Abortos forçados e esterilização obrigatória se banalizaram no país, sobretudo nas áreas urbanas. Servidores públicos que desobedecessem à determinação perdiam o emprego e, não raro, iam para a cadeia.
Por questão cultural, os casais têm preferência por homens. São eles que têm o compromisso de amparar os pais na velhice. Na zona rural, então pouco mecanizada, constituíam mão de obra mais produtiva e mais resistente que as mulheres. Assim, bebês do sexo feminino eram sacrificados para dar a vez aos do sexo masculino.
Passados 35 anos, a agora segunda economia do mundo colhe os frutos da ousadia. Com a espada de Dâmocles sobre a cabeça, corre o risco concreto de ser o primeiro país do planeta a envelhecer antes de ficar rico. Trata-se de trajetória oposta à do vizinho Japão ou de membros da União Europeia, que construíram o Estado de bem-estar social antes de chegar à velhice.
Em 2014, acendeu-se a luz vermelha. Pela primeira vez em 20 anos, a população em idade ativa sofreu baixa. Projeções traçam cenário sombrio para o futuro próximo. Em 2050, um em cada três chineses terá mais de 60 anos e será obrigado a se aposentar. Não só. O deficit feminino, já sério, tende a se agravar. Faltam mulheres e não há perspectiva de aumento do contingente. Estima-se que, em cinco anos, a carência chegue a 30 milhões de pessoas.
Na semana passada, o governo anunciou a flexibilização da política de natalidade. Um casal pode ter dois filhos. A resposta ao desafio talvez tenha chegado tarde. Desde 2013, quando um dos cônjuges fosse filho único, a família tinha permissão para ter o segundo filho. O interesse foi pequeno — 1,41 milhão manifestou o desejo de aderir à novidade.
O desafio da explosão do número de idosos aproxima Brasil e China. A população de ambos os países envelhece, passa para a inatividade e provoca forte impacto nos gastos previdenciários. Quem pagará a conta?
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