O recado das urnas, transparência e transição
. Agora, com as eleições concluídas, a lição que as urnas nos deixam é clara: nossa democracia está cada vez mais consolidada e, a cada pleito, mais fortalecida. No entanto, ainda persistem algumas práticas como o clientelismo e o fisiologismo.
No meu último artigo, publicado na antevéspera das eleições, abordei a importância do processo eleitoral, da democracia e da atenção que os gestores públicos devem dar à infância e à juventude. Agora, com as eleições concluídas, a lição que as urnas nos deixam é clara: nossa democracia está cada vez mais consolidada e, a cada pleito, mais fortalecida. No entanto, ainda persistem algumas práticas como o clientelismo e o fisiologismo.
Durante a campanha, ouvimos uma diversidade de opiniões, críticas e reclamações. Algumas foram construtivas e pertinentes, enquanto outras, pouco agregaram ao debate. Mas essa pluralidade de vozes caracteriza um sistema democrático saudável – um espaço onde a diversidade de pensamento é não apenas permitida, mas incentivada.
Por outro lado, é necessário registrar o lado negativo que vimos nestas eleições: o alto índice de agressividade e baixaria nos debates entre candidatos. Longe de qualquer movimento construtivo, assistimos a cenas que mais lembravam espetáculos deprimentes do que discussões sobre o futuro de nossas cidades e suas populações. Em vez de propostas e diálogos, houve ataques pessoais, trocas de insultos e até cenas lamentáveis, como cadeiradas. Esse comportamento não fortalece a democracia, ao contrário, distorce o verdadeiro sentido da política e gera um ambiente de descrença.
Outro aspecto negativo dessas eleições foi a pouca representatividade política de negros e mulheres entre os eleitos, apesar do regime de cotas. De acordo com dados do IBGE e do TSE os dois grupos (pretos e pardos) somam 56% do eleitorado brasileiro, enquanto apenas 18% das cadeiras serão ocupadas por esses seguimentos, o que representa uma discrepância muito grande.
Os resultados do primeiro turno, com a vitória numérica do centrão (PSD, PMDB e outros), que elegeu a maioria dos prefeitos das capitais e mais de 3.500 prefeituras do interior, fizeram muitos acreditarem no arrefecimento da polarização entre extrema direita e extrema esquerda. No entanto, essa interpretação não reflete toda a verdade. As últimas eleições demonstraram a força da política organizada, que se alimenta dos recursos públicos, como os fundos partidários e as transferências de emendas parlamentares.
Apesar desse cenário, alguns avanços merecem destaque.
Um dos grandes marcos dessas eleições, em São Luís, foi a vitória da luta pelo passe livre e gratuito para estudantes. Essa conquista, fruto de anos de mobilização popular, é um passo essencial para garantir o acesso dos jovens à educação, especialmente aqueles que enfrentam dificuldades financeiras.
O impacto dessa vitória não pode ser subestimado: os estudantes agora têm mais autonomia para frequentar escolas e universidades, sem que o transporte público seja uma barreira.
Uma conquista histórica deste porte, nos remete a outra vitória memorável: a meia passagem. Esse direito, já consolidado, enfrentou forte resistência em sua época, mas hoje beneficia milhares de estudantes, permitindo-lhes acesso não só à educação, mas também à cultura, lazer e oportunidades.
Essas lutas e conquistas mostram que, mesmo diante das dificuldades, nossa sociedade tem a capacidade de evoluir e garantir direitos para aqueles que mais precisam. As urnas nos ensinam mais uma vez que a voz da juventude e da população tem poder. O ato de votar vai além de escolher representantes: é uma ferramenta de transformação social.
A participação política ativa é o caminho para construir um país mais justo, no qual o debate prevalece sobre o ataque, e assegura o futuro das próximas gerações.
A lição é clara: a democracia não é perfeita, mas é o caminho mais seguro para que possamos evoluir enquanto sociedade. Cabe a cada um de nós não apenas respeitá-la, mas trabalhar para seu fortalecimento contínuo.
Se, por um lado, nossa democracia está consolidada e a justiça eleitoral conta com um dos sistemas de urna eletrônica mais modernos e confiáveis do mundo, por outro, enfrentamos os desafios trazidos pelas inovações tecnológicas, como a inteligência artificial, as criptomoedas e o Deepfake. Embora essas ferramentas abram novas oportunidades, elas também trazem riscos emergentes, como crimes cibernéticos e a disseminação de informações falsas, o que exige regulamentação urgente.
Agora, com as eleições concluídas e os eleitos proclamados, é hora de pensar no futuro. O primeiro passo é que os novos governantes montem equipes qualificadas para transformar as propostas de campanha em realidade, enquanto os não reeleitos devem garantir uma transição republicana, transparente e eficiente.
Infelizmente, não é incomum que, em final de gestão, alguns chefes de Executivo e Legislativo pratiquem o chamado “desmonte da máquina pública”, que inclui condutas omissivas e comissivas que prejudicam a administração seguinte. A dilapidação de patrimônio e o desvio de recursos públicos, com o intuito de dificultar a gestão do sucessor, podem configurar improbidade administrativa, crime comum e de responsabilidade.
A partir de 2016, por protagonismo do MPMA, foi promulgada pela Emenda Constitucional nº 075/2016, que acrescentou o parágrafo único do artigo 156, da Constituição Estadual que exige que o prefeito municipal entregue ao sucessor, em até trinta dias após a proclamação dos resultados da eleição, um relatório detalhado sobre a situação administrativa do município. Esse relatório inclui informações sobre dívidas, contratos em andamento, servidores e contas públicas.
Quando estive à frente da chefia do Ministério Público do Maranhão, lancei a campanha “A Cidade Não Pode Parar”, que promoveu a transparência na transição municipal. Naquela ocasião, conseguimos aprovar uma lei que tornou obrigatória a disponibilização das informações de transição e a publicação de todos os atos oficiais em meios eletrônicos, acessíveis ao público. Essa iniciativa foi reconhecida nacionalmente, com o Ministério Público do Maranhão recebendo o prêmio do Conselho Nacional do Ministério Público e passou a integrar as boas práticas do Ministério Público Brasileiro para o fomento e aprimoramento da governança e dos controles interno dos municípios maranhenses.
A transparência na administração municipal é o primeiro passo para garantir que os princípios da impessoalidade e da continuidade administrativa sejam respeitados.
O cidadão merece respeito!