Eles são muitos e não são mais invisíveis. Quase 24% da população brasileira é composta por pessoas que possuem algum tipo de deficiência. De acordo com o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil possui 45 milhões de Pessoas com Deficiência (PCDs). Além de enfrentarem diariamente suas próprias dificuldades e desafios, as PCDs ainda precisam encarar muito preconceito para mostrar suas habilidades profissionais.
Para dar visibilidade a esta significativa parcela da população, o Ministério do Trabalho promoveu, pelo terceiro ano consecutivo, a Semana de Mobilização para Inclusão de Pessoas com Deficiência no mercado de trabalho. Finalizada na última sexta-feira (23), data marcada como o ‘Dia D’, o objetivo da campanha foi colocar em um mesmo espaço os trabalhadores PCDs em busca de uma oportunidade e os empregadores que queiram contratar pessoas com alguma dificuldade física, intelectual ou sensorial.
Segundo a responsável nacional pelo Projeto de Inserção de Pessoas com Deficiência no Mercado de Trabalho, Fernanda Maria Pessoa di Cavalcanti, “da experiência destaca-se que, somente com a articulação dos diversos órgãos, instituições e atores locais, se consegue a mobilização de pessoas e de esforços necessários à consecução do objetivo que, além da inclusão no mercado de trabalho, é também a conscientização e inclusão social”.
Os resultados de ações de sensibilização já podem ser verificados pelo aumento da participação dessas pessoas no mercado de trabalho. Em 2015, o número de empregos para as PCDs cresceu 5,75% em relação ao ano de 2014. Segundo os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) 2015, divulgada pelo Ministério do Trabalho, 403,2 mil pessoas com deficiência atuam formalmente no mercado de trabalho, correspondendo a um percentual de 0,84% do total dos vínculos empregatícios. Assim, observa-se o aumento progressivo da participação nos últimos anos: 0,77%, em 2014, e 0,73% em 2013. Considerando o recorte por gênero, os dados apontam que 259,0 mil postos de trabalho são do sexo masculino e 144,2 mil postos do feminino.
É o caso, por exemplo, de Adriane de Sousa Garcia (32). Ela nasceu com hidrocefalia, que é um acúmulo de líquido nas cavidades cranianas. Como consequência, além de ter uma válvula na cabeça para drenar o excesso de líquido, ela convive com alguns problemas de coordenação motora. Com o ensino médio completo, trabalha como terceirizada na Biblioteca do Ministério do Trabalho, atendendo o público, organizando o acervo e ordenando empréstimos e devoluções de livros. Com o sorriso no rosto, ela destaca a amizade gerada no convívio diário com os colegas como um dos pontos altos de ter um trabalho. “É muito legal estar trabalhando, o problema são algumas pessoas que são ignorantes porque o mais difícil para conseguir emprego é o preconceito e a desconfiança que ainda existe sim”, avalia Adriane.
Legislação e fiscalização – A Lei Federal nº 8.213/91 (Lei de Cotas) está completando 25 anos e foi criada para garantir às pessoas portadoras de necessidades especiais ou que sejam beneficiários do Programa de Reabilitação Profissional pelo Instituto Nacional de Seguro Social – INSS, a possibilidade de exercerem alguma atividade laboral. A chamada Lei de Cotas obriga empresas com mais de 100 funcionários a reservarem de 2 a 5% das vagas de seu quadro de efetivos para essas pessoas.
O Ministério do Trabalho atua para que essa contratação se dê da melhor maneira possível, incentivando e cobrando das empresas sua responsabilidade legal e social, de modo a proporcionar às pessoas com deficiência o acesso a uma vaga no mercado de trabalho em igualdade de oportunidades.
Fernanda di Cavalcanti afirma que a cada ano as fiscalizações vêm se tornando mais constantes para que a regra seja cumprida. Somente ano passado, foram mais de 4,5 mil autuações. Os argumentos mais usados por quem não cumpre a lei, explica, são o alto custo para adaptar o ambiente de trabalho e a falta de qualificação profissional. “Hoje temos 9,3 milhões de PCDs que se encaixam na Lei de Cotas, para 827 mil vagas abertas. Então tem gente, sim, para entrar no mercado de trabalho”, avalia.
Além da Lei das Cotas, as pessoas com deficiência têm direito ao Benefício de Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC/LOAS), que garante um salário mínimo mensal ao “cidadão com deficiência física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo, que o impossibilite de participar de forma plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas”. Para ter direito, é necessário que a renda por pessoa do grupo familiar seja menor que 1/4 do salário-mínimo vigente. Por se tratar de um benefício assistencial, não é necessário ter contribuído ao INSS para ter direito a ele. No entanto, este benefício não paga 13º salário e não deixa pensão por morte. Para saber mais, acesse o link https://goo.gl/3lcJeJ.
Mudanças
A servidora pública Alice Alves da Cruz (60) avalia que o Brasil avançou muito no combate a diferentes formas de discriminação, mas teve uma infância difícil por conta do seu problema de audição. Ela não nasceu com a deficiência. A surdez começou progressivamente, decorrente de algumas outras doenças que ela teve antes de completar o primeiro ano de vida – catapora, varicela e caxumba. De família humilde, de Minas Gerais, as complicações das doenças atingiram seus dois ouvidos, e família foi tratando como conseguia, mas gradativamente ela foi perdendo a audição. “A época da escola foi muito difícil, como não ouvia direito, os colegas implicavam e eu me isolava, era muito tímida e triste. Mas nunca desisti e me descobri como uma pessoa mais forte quando a religião entrou na minha vida”, relembra.
Com ensino médio completo, Alice passou em um concurso público e é servidora desde 1980. E foi só a partir do seu trabalho que ela teve acesso a mais informações e começou a procurar ajuda médica para tratar da audição. Uma cirurgia mal sucedida resultou em mais complicações. Hoje, ela perdeu a audição completa no ouvido esquerdo e conta com um aparelho auditivo no ouvido direito. “O primeiro aparelho eu só consegui comprar com a ajuda dos colegas de trabalho, que se juntaram e fizeram uma ‘vaquinha’. O aparelho atual consegui pelo SUS, depois de quase dois anos de espera, mas consegui”, declarou.
Para ela, a dificuldade para conseguir um trabalho decente tem como base o desconhecimento das pessoas, por isso ela considera programas de mobilização e sensibilização, como o Dia D, tão importantes. “É nessa hora que a gente vê a doença, a rotina de vida e a capacidade de adaptação das pessoas. Essas campanhas ajudam sim muita gente a conseguir uma oportunidade de mostrar o seu valor”, avaliou.
Vagas
No portal Mais Emprego (http://maisemprego.mte.gov.br), Pessoas com Deficiência podem encontrar vagas de trabalho. Na hora de cadastrar seu currículo, a pessoa inclui seu tipo de deficiência. E o empregador, quando for incluir uma vaga, pode classificá-la como exclusiva ou deixar claro que a vaga também pode ser preenchida por PCD, indicando que ser compatível com determinadas deficiências. É uma ferramenta de inclusão, mas acima de tudo é uma ponte entre empregadores e profissionais.