TERRORISMO

‘Extremistas defendem seus egos, não lei islâmica’, diz líder muçulmano brasileiro

Os suspeitos, que têm entre 20 e 40 anos e viviam em Estados diferentes, segundo o Ministério da Justiça

“As pessoas confundem o ‘Estado Islâmico’ com o islamismo. Acabamos pagando o preço de uma fatura que não pedimos”, disse à BBC Brasil o sheik gaúcho Rodrigo Rodrigues, de 39 anos, após a notícia de que 10 brasileiros foram detidos por suspeita de planejar ataques na Olimpíada do Rio.
Os suspeitos, que têm entre 20 e 40 anos e viviam em Estados diferentes, segundo o Ministério da Justiça, trocavam mensagens em um grupo virtual chamado “Defensores da Sharia” (a lei islâmica). Dois deles ainda não foram presos.
Mas o sheik Rodrigues, cujo discurso moderno e vídeos nas redes sociais atraem centenas de muçulmanos para a mesquita do Pari, em São Paulo, disse que militantes de grupos extremistas como o Estado Islâmico “não estão defendendo a sharia, estão defendendo seus egos”.
Ele diz que o discurso do Estado Islâmico na internet é direcionado a pessoas “sem estrutura familiar e religiosa”.
Estas pessoas estariam mais vulneráveis a este discurso “porque há um ‘glamour’ em ser perseguido”.
“Dá status de ‘guerreiro contra o sistema’, dizer que persegue os Estados Unidos. Eu acho que as pessoas procuram isso daí, na realidade. Procuram preencher um vazio com uma oportunidade de virar mártir.”
“Existe (no islamismo) até uma ética para defender aquilo em que se acredita. E o que eles estão fazendo é fora da ética, fora do islamismo.”
O sheik diz conhecer um dos suspeitos presos pela Polícia Federal, e a notícia de seu envolvimento foi preocupante.
“Um deles frequentava nossa mesquita e outras de São Paulo. Nunca falou nada sobre assuntos do tipo, Síria, nada. Mas aí entra num grupo desses de bate-papo e acaba sendo qualificado como terrorista”, lamenta.
“Muitas dessas pessoas vão tirar suas dúvidas sobre o Islã na internet e acabam seguindo pessoas de fora, que não conhecem. Quer saber o que é certo e errado? Pergunte para o sheik da sua comunidade. Não siga pessoas desconhecidas.”
“Não se deve confundir o Islã com tudo isso. As mesquitas são abertas, os sheiks falam português e são acessíveis. Estamos todos juntos contra a violência e contra o terrorismo.”
Preconceito
Em entrevista coletiva na quinta-feira, o ministro da Justiça, Alexandre Moraes, disse que a célula era “absolutamente amadora” e que nunca fez contato direto com o Estado Islâmico.
O grupo extremista, que atua principalmente na Síria e no Iraque, reivindicou a autoria de diversos ataques cometidos recentemente por indivíduos em países como Estados Unidos, França e Alemanha. O sheik diz não duvidar de que poderiam tentar algo semelhante no Brasil.
“Como trata-se de uma organização terrorista, eles são capazes de tudo. Se fizeram o que fizeram na França, são capazes de tudo. Mas não acredito que brasileiros, pessoas normais, fariam isso (um ataque terrorista). Quem faz isso é criminoso, cometeria qualquer crime.”
A prisão dos dez brasileiros, diz Rodrigues, expõe a comunidade muçulmana brasileira a mais desconfiança e preconceito.
“O preconceito está aumentando. Hoje mesmo, ao meio-dia, minha esposa foi ao mercado com meus filhos e as pessoas ficavam dizendo ‘sai de perto que ela vai explodir’ e ‘olha lá os terroristas’. Imagina, chamar uma criança de terrorista.”
Rodrigues, que se converteu-se ao Islã quando ainda era um adolescente de família católica em Porto Alegre. E diz ter passado “por todas essas fases que os brasileiros convertidos enfrentam: querer construir uma mesquita, ir para um país árabe, islamizar o mundo árabe, querer ser revolucionário”.
Hoje, ele usa a experiência para aconselhar jovens na mesquita e em uma escola islâmica na Vila Carrão, zona leste paulistana, onde ensina.
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