Economia solidária
Crise é a palavra mais ouvida em 2016. Saúde, educação, segurança, inflação, obras, emprego, comércio, indústria — não há setor à margem do tsunami político e econômico que se abateu sobre o país. Reações ao quadro calamitoso se dividem em dois polos. Um: de desânimo. É tal a desorganização que escolhas eleitoreiras promoveram na sociedade […]
O outro: de luta. Os membros desse grupo pensam como os chineses. Apagam o s da palavra crise. Transformam-na em crie. Enxergam no ciclo que se abre oportunidade para inovar, buscar saídas para problemas velhos. Assumem o protagonismo antes entregue ao governo. Se o Estado faliu, incapaz de dar respostas satisfatórias às urgências dos cidadãos, a sociedade pode — e deve — assumir o protagonismo.
Exemplos sobressaem Brasil afora. Dois verbos — compartilhar e economizar — encabeçam as iniciativas. Pais se organizam para dividir carona. Famílias se associam para compras no atacado e, assim, obter desconto no total a pagar. Moradores de casas plantam horta e dividem a colheita com vizinhos e amigos. As redes sociais divulgam receitas para aproveitar cascas e talos de hortifrútis que normalmente seriam destinados ao lixo.
Há grupos que aproveitam alimentos que seriam descartados por grandes distribuidoras, em razão da aparência ou do prazo próximo do vencimento, para distribuí-los a famílias e instituições carentes. Ceasas, supermercados e atacadistas são fontes de toneladas de variados produtos que, há muito, se tornaram ingredientes que frequentam a mesa de trabalhadores, estudantes e donas de casa.
Vale lembrar o exemplo do Instituto de Pesquisas e Estudos Aplicados à Sociedade (Ipeas). A associação, voltada para o combate à fome, recolhe em supermercado alimentos considerados impróprios para o comércio. São cerca de sete toneladas diárias de frutas, verduras, legumes, produtos com embalagem danificada que, triados e classificados, garantem a refeição de populações pobres.
Roberto Campos costumava dizer que a tragédia do Brasil é ser país produtor de banana. A fruta, que não exige investimento para ser cultivada, nem esforço para ser colhida, teria forjado pessoas esbanjadoras. Talvez. Mas, tenha ou não tenha razão, o embaixador, famoso pela ironia, focou uma característica nacional. Sem ter sido educado para poupar e compartilhar, o brasileiro precisa incorporar novo paradigma. A crise ensina lição da economia solidária.