Foto: Fred Loureiro/Secom-ES.
As boias instaladas pela Samarco não conseguiram conter completamente a lama de rejeitos do desastre de Mariana
As boias de contenção instaladas às margens do rio Doce para proteger a vegetação na foz [ponto de desaguamento no mar], no vilarejo de Regência, próximo à cidade de Linhares (ES), não conseguiram conter completamente a lama de rejeitos do desastre de Mariana (MG).
Essa região, onde o rio se encontra com o mar, é berçário de uma espécie de caranguejo chamado de Guaiamu. A onda de rejeitos atingiu a vegetação e os locais onde vivem os caranguejos. As boias, instaladas pela Samarco, são tradicionalmente usadas na contenção de vazamentos de óleo, por isso, não se tinha certeza da efetividade da estratégia. Segundo a empresa, foram instalados nove quilômetros de barreiras de contenção para proteger as áreas mais sensíveis do estuário (ambiente de transição entre o rio e o mar) localizado em Regência, distrito de Linhares.
“Segundo análises realizadas ontem, a eficiência das barreiras instaladas nas áreas protegidas chegou a ser de até 80%, se compararmos a turbidez da água de dentro do estuário ao canal principal do rio”, diz a empresa.
A empresa acrescentou que as consequências que não puderem ser mitigadas com essas ações estarão cobertas pelo Termo de Compromisso Socioambiental (TCSA) preliminar, assinado com o Ministério Público do Espírito Santo, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Trabalho. Esse termo de compromisso “prevê medidas que visam garantir o abastecimento de água em áreas atingidas, a apresentação do Plano Emergencial de Contenção, Prevenção e Mitigação dos Impactos Ambientais e Sociais, além da disponibilização de canais de comunicação com as comunidades dos municípios de Baixo Guandu, Colatina, Linhares e Marilândia”.
A Samarco diz ainda que contratou uma empresa especialista “em desastres dessa magnitude, que se dedicará à elaboração dos planos, gestão e supervisão das ações que serão implementadas em todas as áreas impactadas ao longo do Rio Doce”.
A barragem de Fundão, localizada em Mariana (MG), rompeu no dia 5 de novembro, gerando enxurrada de rejeitos de mineração. A barragem é da mineradora Samarco, que pertence à Vale e à anglo-australiana BHP Billiton.
Mar do Espírito Santo é atingido por lama
Foto: Fred Loureiro/Secom-ES.
A enxurrada de lama e rejeitos de minério de ferro que vazou da barragem da mineradora Samarco, chegou ao mar do Espírito Santo
Depois de 16 dias aterrando os rios Gualaxo do Norte, do Carmo e Doce, a enxurrada de lama e rejeitos de minério de ferro que vazou da barragem da mineradora Samarco, em Mariana, na Região Central de Minas, chegou ao mar, nesse sábado, por volta das 18h. Pescadores de Regência Augusta, distrito de Linhares (ES), onde fica a foz do Rio Doce, se apressaram em remover seus barcos do estuário e se uniram em uma manifestação com cerca de 100 pessoas ligadas à atividade, ao turismo e à proteção das tartarugas marinhas que se reproduzem na região.
Uma passagem para o mar havia sido aberta dias antes pela prefeitura local, já que a foz tradicional do rio, que fica ao sul, estava assoreada e bloqueada. Máquinas e operários a serviço da mineradora intensificaram o trabalho de alargamento da passagem e posicionaram também barragens de boias para tentar direcionar a lama para longe da comunidade e diretamente para o mar, onde a esperança é de que o material seja diluído mais rapidamente. Ontem, decisão da Justiça Federal determinou que a empresa se esforce para acelerar a dispersão dos poluentes.
“É uma visão aterradora. As pessoas aqui de Regência estão revoltadas, principalmente os jovens, porque são envolvidos com a conservação ambiental que é parte de seu futuro aqui”, disse o educador ambiental Carlos Sangalia, do Projeto Tamar, de proteção às tartarugas marinhas. Na noite de sexta-feira, a Justiça do Espírito Santo, em níveis estadual e federal, chegaram à mesma conclusão – ainda que haja dúvidas sobre qual delas tem competência para o assunto – sobre a lama, posicionando-se a favor de que a o material escoe o mais rápido possível pelo Rio Doce e atinja o mar, trazendo menor risco à flora e a fauna costeiras.
A controvérsia ocorreu por que na quarta-feira a Justiça Federal em Vitória concedeu decisão em favor do Ministério Público Federal (MPF) em ação civil pública que determinava que a Samarco impedisse a lama de atingir o litoral, sob pena de multa de R$ 10 milhões. Na sexta-feira, a Vara da Fazenda Pública, Registros Públicos e Meio Ambiente de Linhares, da Justiça Estadual, determinou que a empresa deveria utilizar de todos os métodos para fazer com que a lama não ficasse retida e fluísse em direção ao mar, como preconizaram o Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema) do Espírito Santo, e do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBIO). Se não o fizesse, a multa seria de R$ 20 milhões e mais R$ 1 milhão por dia de descumprimento.
No mesmo dia, o juiz federal Rodrigo Reiff Botelho recebeu da Samarco um pedido de liminar para cancelar a ação que determinava o barramento da lama, em oportunidade em que a empresa apresentou seu plano de recuperação e mitigação dos efeitos do vazamento. Com isso, o juiz declarou que não determinou barramentos no rio e sim resguardava a proteção aos ecossistemas, admitindo que a passagem da lama seria inevitável, mas poderia ser menos danosa. Afirmou também, que a Justiça Estadual é incompetente para julgar esse mérito, por ser o Doce uma bacia federal.
A Samarco anunciou, após a decisão da Justiça, o monitoramento do avanço da enxurrada de lama por meio de câmeras instaladas em um balão. O equipamento fará varreduras na parte Sul da foz do Rio Doce, no distrito de Regência Augusta, até o povoamento dessa região, no município de Linhares. O balão leva câmeras de sensor triplo, capazes de produzir imagens em alta resolução e tempo real, dia e noite, permitindo acompanhar e mapear a região, com coordenadas georreferenciadas.
Para isolar a fauna e a flora que vivem no entorno nas duas margens do rio e em algumas ilhas localizadas no estuário, 9 mil metros de barreiras feitas de lona 100% impermeável e fixadas no fundo do rio estão sendo instalados em sentido longitudinal, mas sem impedir a chegada dos rejeitos ao mar. As barreiras variam de 60 centímetros a até 2,1 metros de altura, adaptadas de acordo com a profundidade de cada ponto de instalação. De acordo com a Samarco, as estruturas têm alta resistência e são capazes de suportar ventos de 20km/h e ondas de três metros. Quatro frentes de trabalho, com mais de 50 pessoas e diversas embarcações, atuam simultaneamente na instalação.
Além dessas medidas, a Justiça do Espírito Santo determinou o imediato resgate de representantes de todas as espécies da fauna aquática nativa e que têm o rio como hábitat, com o intuito de salvaguardar a variedade genética, com exceção de espécies exóticas, devendo ser quantificados e catalogados, com amparo técnico e supervisão dos órgãos competentes. A empresa deverá também resgatar, imediatamente, ovos das tartarugas marinhas que podem ser afetadas pela mancha de contaminação.