ARTIGO

Espectador ou protagonista?

Na contemporaneidade, elevam-se vozes críticas à postura ativa do Poder Judiciário como espaço de realização dos direitos, sobretudo, daqueles de feição econômica e social. As oposições focam-se, sobretudo, no princípio da separação dos Poderes e na ausência de legitimidade democrática do Poder Judiciário para a consecução e de políticas públicas que impactam no manejo do […]

Na contemporaneidade, elevam-se vozes críticas à postura ativa do Poder Judiciário como espaço de realização dos direitos, sobretudo, daqueles de feição econômica e social. As oposições focam-se, sobretudo, no princípio da separação dos Poderes e na ausência de legitimidade democrática do Poder Judiciário para a consecução e de políticas públicas que impactam no manejo do orçamento.
A fim de exemplificar o que se trata, poderia citar a judicialização do direito à saúde que se viveu mais intensamente nos últimos anos. Tais demandas transferem ao Poder Judiciário a decisão — bem caracterizada pela doutrina como escolhas trágicas — acerca da alocação de recursos para prestação de medicamentos, tratamentos médicos, serviços hospitalares, entres outros. Parece-nos que o Poder Judiciário não só pode — como deve — atuar ativamente como importante realizador de direitos e garantias constitucionalmente previstos, sobretudo aqueles econômicos e sociais, que ainda precisam sair do texto previsto para virar realidade instituída.
Todos os Poderes, e sobretudo o Judiciário pela sua falta de lastro sufragal, retiram do texto constitucional sua legitimidade para atuação, no qual a dignidade da pessoa é fim e fundamento. Assim, a atuação da jurisdição no fortalecimento dos direitos não contraria o ideal de democracia, ao revés, o reforça.
A democracia, nessa visão, ganha outros contornos e não dialoga exclusivamente com o princípio majoritário. O processo de alargamento da democracia na sociedade contemporânea não ocorre apenas pelo aperfeiçoamento dos modelos de participação democrática, mas também e sobretudo, por meio da extensão da democratização da arena política à arena econômica e social, visto que a democracia real apenas exsurge com a efetiva garantia de direitos e sua respectiva realização.
Quando os direitos sociais não são levados a sério, a própria proteção de direitos civis e políticos perde o sentido estrutural, tornando-se apenas garantia formal. É necessária, portanto, a adoção de medidas que minimizem o arbítrio do Estado e das maiorias ocasionais que estejam nos postos decisórios das instituições políticas.
Alçar o Poder Judiciário à realização dos direitos humanos, sobretudo aqueles sociais mais básicos, não é apenas razoável, mas imperativo. O uso moderado de altivez judicial na resolução de disputas controversas sobre direitos, sobretudo sociais, tem efeitos positivos na consolidação de renovada cultura constitucional.
Um papel ativo não deve ser confundido com protagonismo monológico. O Judiciário deve ser permeável à interlocução com outros intérpretes da Constituição, porque discordância interpretativa é condição essencial para o desenvolvimento do direito constitucional. Mas esse não é um solilóquio. Não podemos ignorar a importância dos movimentos sociais e da pressão que tomaram essas questões centrais para o Judiciário.
A cooperação deve informar a deliberação entre aos diferentes Poderes, e também entre as diferentes esferas federativas. Não há concorrência, mas, sim, somatório de forças na realização das prerrogativas da dignidade humana. Especificamente no que toca ao âmbito de defesa dos direitos sociais, tal se mostra imprescindível. Muitas vezes, esteiadas em diferentes interpretações da repartição constitucional de competências, as esferas federativas altercam-se em jogo de transferência de responsabilidades na implementação de tais direitos — em que pese a jurisprudência pacífica já reconhecer a responsabilidade solidária na matéria. Solidariedade aqui ganha contornos de cooperação institucional entre os Poderes e entes.
É necessário dar um passo adiante em direção à concepção integral dos direitos humanos, não apenas pela porta jurisdicional, mas alçando a realização dos direitos sociais como verdadeiros direitos humanos. Partindo dessa premissa, não se pode, por um lado, com base em concepção amesquinhada de democracia e da tripartição dos poderes, conceber o Judiciário como mero espectador nem, por outro, conferir-lhe protagonismo monológico na realização dos direitos. Ambos os extremos aqui afrontam o texto constitucional.
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