Evitar que os haitianos caiam nas mãos de traficantes e coiotes é uma das maiores preocupações do Ministério das Relações Exteriores. Por isso, o Brasil iniciou um processo para acelerar a emissão de vistos na Embaixada brasileira em Porto Príncipe. A situação dos imigrantes foi tratada em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) nesta segunda-feira.
Segundo o embaixador Carlos Alberto Simas Magalhães, subsecretário-geral das Comunidades Brasileiras no Exterior, a emissão de visto permanente de caráter humanitário em Porto Príncipe saltou de 600 para 1.800 por mês desde o início de junho.
— É preciso que a população se convença de que a rota legal é a melhor alternativa. Desde 8 de junho, são 470 vistos por semana. É preferível esperar um ou dois meses e conseguir visto no consulado brasileiro do que cair nas mãos de coiotes — alertou o embaixador.
O representante do Itamaraty garantiu ainda que o Brasil não vai mudar sua política de acolhimento aos imigrantes e disse que o fluxo migratório não deve assustar o país.
— O Itamaraty continuará prestando essa assistência, continuará concedendo os vistos enquanto prevalecer a atual política de caráter humanitário, que não tem perspectiva de terminar, a curto prazo — assegurou o embaixador, para quem existem hoje no Brasil entre 60 mil a 70 mil haitianos, mais do que os 50 mil oficialmente estimados.
Violações
Embora tenham reconhecido o acolhimento humanitário do Brasil a seus conterrâneos, os haitianos Alix Georges e Fedo Bacourt reivindicaram melhores condições nos abrigos, mais atenção dos governos estaduais e das prefeituras, além de denunciarem o desrespeito de muitas empresas à legislação trabalhista.
Eles reclamaram também de violações de direitos humanos da força militar internacional presente no Haiti e defenderam a retirada dos militares do país.
— Não precisamos de 9 mil estrangeiros. O Haiti não é um país violento e não tem guerra civil que mereça a presença de militares — reclamou Alix Georges.
O coordenador-geral do CSP-Conlutas, José Maria de Almeida, disse que é crescente o número de casos de haitianos sendo submetidos a condições de escravidão em empresas brasileiras.
— Temos muitos picaretas que, na tentativa de aumentarem seus lucros, se aproveitam da vulnerabilidade dos estrangeiros e os obriga a trabalhar em condições inaceitáveis para um trabalhador brasileiro — lamentou.
José Maria de Almeida sugeriu que o dinheiro gasto pelo governo brasileiro para manter militares no Haiti seja empregado, por exemplo, na melhoria dos abrigos.
— Um país das dimensões do Brasil não pode assegurar um abrigo minimamente decente em São Paulo? Não temos dinheiro para isso nesse país? — indagou.
Reconhecimento
O senador Jorge Viana (PT-AC) disse que, apesar de todas as dificuldades, o governo do Acre tem feito um “trabalho extraordinário” com os haitianos que chegam ao estado, oferecendo alojamento, atendimento médico, comida e assistência social. Apesar disso, segundo ele, o feito não é reconhecido pela imprensa.
— Acho um desrespeito, pois a imprensa noticia apenas como se o Acre estivesse importando imigrantes e os distribuindo para Sul e Sudeste para incomodar prefeitos e governadores. Na verdade, o trabalho humanitário feito pelo governo é extraordinário — afirmou.
O parlamentar disse ainda que só quem conhece ou esteve no Acre tem a dimensão da dificuldade que é receber tanta gente necessitada de ajuda num curto espaço de tempo:
— Estamos lidando com um problema que é de todos. Que estado está preparado para receber 40 mil imigrantes em três anos? O Acre recebeu e não houve nenhum elogio, pelo contrário, só críticas — lamentou.
Conforme o secretário de Justiça e Direitos Humanos do Acre, Nilson Mourão, se não tiver problema com a documentação, cada hatiano fica no Acre, em média, por 15 dias.
Segundo ele, o número de haitianos que chegam de forma irregular está diminuindo, mas o governo ainda tem desafios, como assegurar dinheiro para melhorar a estrutura física do abrigo e melhorar a inserção social do imigrante e até a comunicação, visto que não há sequer um profissional para fazer a tradução.
O abrigo pode atender 150 pessoas, hoje são 300, mas já chegou a ter mais de 1.100 imigrantes.
A audiência desta segunda-feira da CDH foi presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS). Também participaram o secretário Nacional de Justiça, Beto Vasconcelos; o secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Roberto Martins Maldos; o coordenador do Conselho Nacional de Imigração do Ministério do Trabalho e Emprego, Luiz Alberto Matos dos Santos; e a irmã Rosita Milesi, da Arquidiocese de Campinas e diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos.