Centenas de turistas estrangeiros se aglomeravam na madrugada deste sábado 27 no aeroporto de Enfidha para abandonar a Tunísia, após o atentado contra um hotel da região que deixou 38 mortos, reivindicado pelo grupo Estado Islâmico. Diversos voos saindo do aeroporto tinham como destino Londres, Manchester, Amsterdã, Bruxelas e São Petersburgo, muitos contratados pela operadora Thomson. “Temos medo, aqui não é seguro”, disse Leon, um jovem do País de Gales, no aeroporto.
Um jovem atirador ligado ao Estado Islâmico matou 38 pessoas, a maioria turistas estrangeiros, em um ataque contra um hotel de Sousse, balneário no leste da Tunísia, no pior atentado da história recente do país. A ação deixou ainda mais de trinta feridos, alguns em estado crítico, segundo o ministério da Saúde.
O primeiro-ministro tunisiano, Habib Essid, revelou que a maior parte das vítimas era britânica. Sobre a “nacionalidade dos mortos (…) a maior parte era britânica, depois vêm os alemães, belgas e pessoas de outros países”, disse Essid em entrevista coletiva, admitindo que há franceses entre as vítimas.
Essid anunciou a abertura de uma investigação “para determinar responsabilidades”, e a convocação de reservistas do Exército “para reforçar a segurança nos locais sensíveis (…) e sob a ameaça de ações terroristas”. “Um plano excepcional para reforçar a segurança nos locais turísticos e arqueológicos” será adotado “com a mobilização de unidades da polícia e do Exército ao longo do litoral e no interior dos hotéis a partir de 1º de julho”.
Essid anunciou ainda que um “congresso nacional” sobre o combate ao terrorismo será organizado em setembro, e prometeu recompensas para informações que levem à prisão de “elementos terroristas”. O grupo extremista sunita Estado Islâmico (EI) reivindicou a autoria do atentado: “o soldado do califado (…) Abu Yahya al-Qayrawani (…) conseguiu atingir o alvo no hotel Imperial”, matando quase 40 pessoas, “a maioria deles indivíduos de Estados da aliança cruzada que combate o Estado do califado”.
O comunicado afirma que o ataque visou “os antros de (…) fornicação, vício e apostasia na cidade de Sousse” e “superou as medidas (de segurança) reforçadas em torno destes antros na praia de Kantaoui”. O jovem armado, identificado como Seifeddine Rezgui, um tunisiano originário de Gaafour, atacou o hotel Riu Imperial Marhaba, no Porto de Kantaoui, 140 km ao sul de Túnis. Segundo o secretário de Estado para questões de segurança, Rafik Chelly, o agressor “seria um estudante sem ficha na polícia”.
O atentado atinge um país que tem registrado um aumento da ameaça jihadista desde sua revolução em 2011, e ocorre três meses após o sangrento ataque contra o museu do Bardo, em Túnis, que representou um forte golpe ao setor do turismo. Também acontece no mesmo dia de dois outros ataques ligados ao movimento jihadista, um contra uma mesquita xiita no Kwait, que fez ao menos 13 mortos e que foi reivindicado pelo grupo Estado Islâmico (EI), e outro na França, onde um homem foi decapitado.
Em função desse cenário, presidente tunisiano, Beji Caid Essebsi, que visitou o local da tragédia, afirmou que a Tunísia não tem como enfrentar sozinha a ameaça jihadista, e por isso é necessária uma “estratégia global”. “Percebemos que a Tunísia enfrenta agora um movimento internacional. Ela não pode responder sozinha a isso. Como prova, no mesmo dia, ao mesmo tempo, a França foi alvo de uma tal operação, o Kuwait também. Isso prova a necessidade de uma estratégia abrangente e que todos os países democráticos devem agora unir forças”, declarou.
Neste contexto, o presidente francês, François Hollande, e Essebsi expressaram “solidariedade frente ao terrorismo”, segundo um comunicado da presidência francesa. Durante uma conversa telefônica, “os dois presidentes expressaram um ao outro sua solidariedade e intenção de prosseguir e intensificar a cooperação na luta contra o terrorismo”. De acordo com o porta-voz do ministério do Interior, Mohamed Ali Aroui, o estudante “entrou por uma entrada na parte de trás do hotel antes de abrir fogo”.
No momento do ataque “havia 565 clientes no hotel. Os clientes são majoritariamente do Reino Unido e da Europa central”, indicou o grupo em um comunicado. “Foi um ataque terrorista contra o hotel Marhaba. O agressor foi abatido, mas podem haver outros. Se havia outros elementos com ele não podemos nem confirmar não descartar”, disse Aroui à televisão estatal. A Tunísia já havia expressado temores quanto a atentados com a aproximação da alta temporada turística e anunciou medidas de segurança reforçadas.
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‘Calma mortal’
Um turista britânico relatou à televisão SkyNews que o ataque ocorreu por volta do meio-dia (8h de Brasília). “O meu filho de 22 anos acabava de voltar do mar (…) quando vimos a uma centena de metros à nossa esquerda o que pensávamos ser fogos de artifício”, relatou Gary Pine, de Bristol, no sudoeste da Inglaterra. “Foi só quando começamos a ouvir o barulho de tiros que percebemos que era muito mais grave do que fogos de artifício”.
“Houve uma correria em massa da praia (…) e algumas pessoas ficaram levemente feridas durante a confusão e o pânico”, acrescentou. “Eu acredito ter ouvido vinte ou trinta tiros”. “Agora estou na recepção com cerca de 200 outros clientes estrangeiros. Devemos ir embora? Para onde? Há uma calma mortal agora”, indicou.
A embaixada da França em Túnis mandou um aviso por SMS a seus cidadãos para manter a vigilância e “limitar saídas e encontros”. Em 2013 um homem-bomba se explodiu em uma praia em Sousse, mas sem deixar vítimas. Este atentado ocorre pouco mais de três meses depois do violento ataque contra o Museu do Bardo na capital, reivindicado pelo EI. Vinte e um turistas e um policial local morreram no ataque de 18 de março.
Depois do atentado ao museu, o setor estratégico do turismo teve resultados muito ruins em abril, com uma queda de 25,7% do número de turistas e do 26,3% das rndas em relação ao ano anterior. O turismo, que representa cerca de 7% do PIB da Tunísia e mais de 400 mil empregos diretos e indiretos, já sofre com as crises políticas e a ascensão do movimento jihadista que se seguiu à revolução de janeiro de 2011.
A ministra do Turismo, Salma Rekik, anunciou em abril “medidas excepcionais” para reforçar a proteção dos sítios e circuitos, bem como o controle nos aeroportos, estradas e todos os meios de transporte. A Tunísia, pioneira da Primavera Árabe, concluiu a sua transição com eleições no final de 2014, mas a sua estabilidade pode ser ameaçada pelo aumento da ameaça jihadista.
Desde a revolução de 2011, o país enfrenta o crescimento do movimento jihadista, especialmente na fronteira com a Argélia, onde há confrontos regulares entre homens armados e soldados. Dezenas de soldados e policiais foram mortos nos últimos quatro anos em confrontos e emboscadas, a maioria na região do monte Chaambi (centro-oeste).