ARTIGO

O supremo direito de errar

Chamar processo de impeachment de golpe é querer, mais uma vez, enganar a opinião pública. – Ferreira Gullar A que ponto chegamos! Pior, a que ponto cheguei eu, obrigado a começar uma crônica semanal fazendo transcrição de artigos de lei! Parece pedantismo, mas é necessário, sem o que o texto correrá o risco de não […]

Chamar processo de impeachment de golpe é querer, mais uma vez, enganar a opinião pública. – Ferreira Gullar
A que ponto chegamos! Pior, a que ponto cheguei eu, obrigado a começar uma crônica semanal fazendo transcrição de artigos de lei! Parece pedantismo, mas é necessário, sem o que o texto correrá o risco de não ser bem compreendido. Vamos lá.
Reza o parágrafo único do art. 1º da Constituição Federal que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Esse dispositivo já define o caráter democrático da República. No art. 2º da mesma CF está dito que “são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Isto é, nenhum dos Poderes será superior aos outros para que não se configure uma ditadura. Nos arts. 51, III, e 52,XII, dispõe a Carta que, respectivamente, “compete privativamente” à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal “elaborar seu regimento interno”. Ou seja, os regimentos internos das duas casas não são elaborados pelo Supremo Tribunal Federal, pois isso retiraria a independência do Poder Legislativo, com a instauração da ditadura do Poder Judiciário . A sua vez, o padrão de autogoverno outorgado pela CF aos tribunais está enunciado quando no art. 96, I, letra “a”, está dito que, “compete privativamente aos tribunais (…) elaborar seus regimentos internos”. Em suma, disse a Constituição que em assuntos de regimento interno, por competência privativa e exclusiva dos respectivos entes, um Poder não pode invadir a esfera de outro, como que a dizer: “em festa nambu, jacu não entra”.
Essa regração, que sempre existiu nas Constituições brasileiras, faz lembrar um episódio ocorrido há bons tempos, fugindo-me a data e o número da lei. Narram os memorialistas que, certa vez, deu na veneta de o Congresso Nacional aprovar uma lei que era marcadamente invasiva do funcionamento interno dos trabalhos do Supremo Tribunal Federal. O que daí resultou foi simplesmente hilariante, com STF não tomando conhecimento da lei maluquinha e espúria, tratando-a como um papel usado que tivesse voado do sanitário. Nem mesmo se deu ao luxo de decretar-lhe a inconstitucionalidade…
Sucede que agora em dezembro tivemos repetido fato idêntico, apenas em sentido inverso, quando o STF, a pretexto de apreciar questões rituais sobre um processo de impeachment, imiscuiu-se ostensivamente sobre assuntos de competência interna da Câmara dos Deputados. Ou seja, o STF quer elaborar o regimento interno de uma casa política, eleita pelo povo (votação aberta ou secreta, comissão processante eleita pelo plenário ou indicada pelos líderes e vai por aí…)
Que fazer diante desse descalabro? Decisão do STF deve ser cumprida, pois não há a quem recorrer; essa Corte tem o supremo direito de errar porque é a que fala por último.
O certo é que o processo de impeachment foi politicamente travado por cima do poder político do Congresso Nacional. Os ministros do STF (8 em 11) não foram eleitos pelo povo. Sua legitimação de Poder é apenas formal eis que lhes falta a sagração legitimante do voto popular. Os 8 ditadores do judiciário estão esquecidos de que o impeachment é o único instrumento de responsabilidade política permitido pelo presidencialismo. De índole política, não admite solução judiciária. E muito menos deve ser visto como “golpe” a despeito do que assoalham juristas de fancaria.
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