CRIME

Conheça quais são as facções que agem nos bairros da capital

A cidade está dominada por esses grupos que se dedicam às práticas delituosas

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São Luís vive a verdadeira síndrome do medo com a presença de facções criminosas que se instalaram em pontos diversos. A cidade está dominada por esses grupos que se dedicam às práticas delituosas, notadamente ao tráfico de drogas, impondo suas próprias leis, instituindo um código de ética que não pode ser burlado, mesmo por indivíduos alheio ao grupo dominante, assim como os membros de outras facções, geralmente, inimigas.

Quem domina bem este assunto é o jornalista e pesquisador Nelson Chagas Melo Costa, graduado pela Universidade Federal do Maranhão e pós-graduado em Perícia Criminal, autor de livros em que aborda fatos do submundo do crime, ora escrevendo o terceiro volume da quadrilogia “Guerra Urbana”, com foco na psicologia do “homem vida loka”, como chama os faccionados. Ingressou no jornalismo impresso em 2013, justamente no ano em que as facções criminosas se abriram para a sociedade maranhense de maneira cruel, com rebeliões e decapitações no Complexo Penitenciário de Pedrinhas.

Nelson Melo  iniciou suas pesquisas informalmente a partir de 2014, no sentido de  selecionar matérias que fazia acerca do crime organizado. Atualmente, escreve um  romance policial ambientado em São Luís, discorrendo sobre a violência urbana na ilha. Ele já lançou dois livros sobre o assunto: “Guerra Urbana-morrendo pela vida loka” e “Guerra Urbana – o homem vida loka”. Sua obra já está no Paraguai e em Portugal, levada por colegas de pesquisas. Mantém, também o seu site www.nelsonmelo.com.br, onde divulga artigos referentes ao crime organizado e temas relacionados.

Como tudo começou

Conta que nas suas pesquisas apurou que nas décadas de 1990 e início dos   anos 2000, havia várias gangues na Grande Ilha, como Garotos da Bota Preta (GBP), Jovens Justiceiros (JJ), Garotos Rebeldes (GR) e Garotos Geração 2000 (GG 2000). Somente no Bairro da Liberdade havia pelo menos cinco “galeras”, como também eram conhecidas. Esses grupamentos se enfrentavam nas ruas, em clubes e até em escolas públicas. Ele destaca que as gangues não se digladiavam por questões financeiras, somente por aventura e bairrismo, isto é, uma galera de um bairro se declarava inimiga da galera de outro bairro, mesmo que vizinho. Quando se encontravam, as brigas se desenvolviam, com o uso de armas brancas, socos e pedras. A partir dos anos 2000, os conflitos ficaram mais violentos, com o uso de armas de fogo nos combates.

Mesmo com essa mudança, o bairrismo continuava sendo o centro das rivalidades. Ao mesmo tempo,  na Penitenciária de Pedrinhas e na antiga Central de Custódia de Presos de Justiça, no Anil, os conflitos entre gangues também ocorriam. Um destes grupos se destacava no meio carcerário: Anjos da Morte (ADM), fundada pelos detentos identificados como “Sapato”, “Bacabal”, “Satanás” e “Ronny Boy”. Eram mercenários, pois matavam outros presos em troca de dinheiro. Muitos assassinatos no presídio, naquela época,  tiveram o “dedo” da ADM.

Esta gangue matava de forma cruel, visto que esquartejava os detentos e escondia os pedaços do corpo. Conforme apurou o pesquisador Nelson Melo,  esses mercenários despachavam os cadáveres despedaçados, em sacos de lixo. Em um dos episódios, esses detentos praticaram o canibalismo, comendo parte do fígado de uma das suas vítimas. Isso ganhou notoriedade internacional.  A Anjos da Morte, tinha rivais no contexto carcerário, pois gangsteres da Liberdade, Coroado, Anjo da Guarda, Ilhinha, Vila Isabel Cafeteira, Barreto e outros bairros, atuavam como oposição.

Capital versus interior

Nesse intervalo, ocorriam conflitos entre os ”detentos da capital” e os “detentos do interior”. Antes de 2003, muitos presos da Baixada maranhense eram transferidos para o Complexo de Pedrinhas, o que desagradava os bandidos moradores da ilha, que se achavam os “donos do “pedaço” e superiores aos “forasteiros”, que ao chegar do interior, eram humilhados pelos da capital, que os botavam para “limpar o boi” ou “dormis na praia”, gírias dos internos que significam, respectivamente, limpar o vaso sanitário e dormir no chão da cela.

Conforme Nelson Melo, a partir de 2003, os presos do interior se reuniram depois que um grupo voltou dos presídios federais, com pensamentos avançados de criminalidade. Nessa “assembleia” que ocorreu dentro do Complexo de Pedrinhas, os detentos criaram o Primeiro Comando do Maranhão (PCM), que era uma filial do PCC, cujo estatuto foi repassado por telefone. Várias cópias deste documento foram feitas de forma manuscrita. Inclusive um dos detentos perdeu uma das cópias e, por pouco, não foi assassinado como punição pela irresponsabilidade.

A partir de então, os presos do interior, liderados por “Saddam”, idealizador do PCM, anularam as humilhações que sofriam. Os da capital ficaram assustados, pois, o inimigo agora estava organizado. Anos depois, esses internos viraram o jogo e também criaram uma facção criminosa, que foi chamada de “Bonde dos 40 Ladrão”, uma referência à obra  “Ali Babá e os 40 Ladrões”,  convém lembrar que o PCM, inicialmente foi chamado de “Bonde da Baixada” e “tropa do Jamaica”.

Facções dominaram bairros

Então, àquela altura, a Anjos da Morte já estava extinta, visto não ter forças para enfrentar dois inimigos poderosos: “Bonde da Baixada” e “Bonde dos 40 Ladrão”. A guerra urbana, então estava declarada. As duas facções saíram do Complexo de Pedrinhas e venderam a ideia nos bairros da Grande Ilha e no interior maranhense. As antigas gangues foram “engolidas”, pelo fenômeno e aderiram a outro grupo.  “Rua da Vala”, do João Paulo e Coroado decidiram ficar com o Bonde dos 40, assim como os bandidos da Divinéia, Vila Luizão e Sol e Mar.

As gangues rivais da Liberdade e Camboa aderiram à bandeira do Bonde dos 40, também. Inclusive, esses criminosos soltaram até foguetes para comemorar o fim de uma guerra histórica entre os grupos. O Altos do Calhau ficou com o PCM e se tornou a base dessa facção. O Centro do Comando do Bonde ficou estabelecido na Ilhinha, no São Francisco. De 2013 até meados de 2015, ocorreram muitos assassinatos na região metropolitana  de São Luís, porque as duas organizações ainda estavam em processo de disputa de territórios.

Com a estabilização dos territórios, o índice de homicídios caiu, pois as facções se preocuparam somente com a questão financeira, cujo pilar é o tráfico de drogas. Um racha aconteceu no PCM, pois os faccionados da Cidade Olímpica se rebelaram, sob a liderança de Gaspar, e fundaram o Comando Organizado do Maranhão ou Crime Organizado do Maranhão (COM). Esse  grupo ficou concentrado ali nas imediações, como Vila Riod e Santa Clara. Simultaneamente, houve uma dissidência no Bonde dos 40, pois faccionados da Vila Cotia, sob a liderança de “Seu Mauro”, se rebelaram a fundaram o Comando Vermelho, que até hoje é uma filial da matriz carioca.

Assim, os homicídios novamente sofreram uma alta, mas depois caíram, quando os novos grupos se estabeleceram nas “quebradas”. O PCM, então, se desintegrou no Maranhão. O último reduto foi a cidade de Rosário. Devido a isso, o PCC passou a atuar aqui em sua forma pura, sem necessidade de intermediário. Em 2019, surgiram os “Neutros”, após iniciativa de “Carlinhos da Riod” e “Diabo Louro”. Esse grupo ficou na Eco Tajaçuaba, condomínio do programa Minha Casa, Minha Vida, na zona rural da capital, e também outros locais como Residencial Tiradentes, Albino Soeiro e Vila Riod.

Em uma nova mudança no crime organizado, o PCM foi reativado, no final do ano passado, dentro  do Complexo de Pedrinhas por Gaspar, que estava no CV. Por conta disso, o Comando Vermelho enfraqueceu na Grande Ilha, perdendo vários territórios. O Bande dos 40 aproveitou essa tensão e conseguiu a adesão de vários faccionados do CV, sobretudo na Camboa. Mas, o novo PCM também se expandiu e se fixou no Bairro de Fátima, Coroadinho e outras comunidades.

Segundo Nelson Melo, o PCC e o CV são muito fortes no interior maranhense. Na Região Tocantina, as duas facções se enfrentam, numa repetição da rivalidade nacional. O Bonde dos 40 é  tímido fora da Grande Ilha, mas conseguiu chegar ao Piauí, onde já tem até blocos nos presídios. Essa é a realidade da violência urbana no Maranhão.

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